Atravessei o portal e o ar frio da base me recebeu como um cobertor preciso. Naruto dormia enrolado contra o meu peito, embalado por uma aura verde tênue que eu mantinha ativa por precaução. Por um instante, aquela respiração tranquila cancellou o caos que eu deixara para trás. Então a realidade voltou: o mundo lá fora estava em frangalhos, e eu carregava nele a responsabilidade de um destino inteiro.
Pela primeira semana, tudo se transformou em rotina improvisada. Alpha X transformou uma câmara adjacente em um berçário perfeito: temperatura controlada, um sistema automático para aquecer e medir mamadeiras, sensores que vibravam ao menor ruído do bebê. Eu era o operador humano no circuito — desajeitado nas primeiras trocas de fralda, atrapalhado nas primeiras tentativas de embalar, mas estranhamente rápido em aprender a decifrar as sutis notas do choro.
Alpha X preenchia as lacunas do conhecimento. Instruiu sobre horários de alimentação, simulações de sucção para treinar reflexos de amamentação (quando possível) e fórmulas nutritivas adaptadas para recém-nascidos humanas com suplementos sintéticos que a mesa multiversal podia compilar. Cada solução técnica vinha com um custo: consumo extra de energia na base, necessidade de descarregar dados médicos e calibrar o berço para evitar leituras que pudessem ser detectadas do lado de fora.
Os dias passavam em silêncio e alertas. Entre um cuidado e outro, eu monitorava Konoha. Alpha X reportava buscas nas redondezas da maternidade, interrogatórios discretos e um clima de apreensão. Logo percebi que aquilo não ficaria apenas em patrulhas: a liderança de Konoha reagia.
No gabinete do Hokage, Hiruzen Sarutobi reunira o conselho em caráter extraordinário. Imagens que me chegaram por Alpha X mostravam a sala: rostos cansados, mapas espalhados, velhos jōnins discutindo em voz baixa. Hiruzen, calmo e firme, ordenou medidas práticas. Reforçar rondas noturnas, priorizar sigilo e evitar pânico — mas também abrir linhas de investigação discretas para não deixar brechas. Ele delegou patrulhas específicas para Jōnin de confiança e ordenou que a ANBU visse pistas sem expor a posição da maternidade. A serenidade do velho Hokage dava forma ao caos.
A resposta foi imediata. ANBU intensificou a varredura, jōnins de elite fizeram rondas invisíveis e, pela primeira vez, Hiruzen autorizou bloqueios temporários em rotas menos movimentadas. Um frio prático percorreu minha espinha: Konoha estava agindo com cuidado, mas com firmeza — e isso significava que qualquer ruído que eu fizesse poderia ser logo rastreado.
Enquanto isso, a vida no santuário oculto seguia. Aprendi que bebés têm horários implacáveis, e que o corpo humano não se adapta ao estresse só porque a mente está decidida. No terceiro dia acordava com olheiras, mãos trêmulas e um carinho que me apertava o peito. Desenvolvi pequenos rituais: cantarolar uma canção antiga que minha avó me contou, polir brinquedos que eu mesmo havia criado com a mesa multiversal, programar holos suaves para simular rostos amigos.
Alpha X também implementou contramedidas técnicas. Camuflagem gravitacional para dispersar assinaturas magnéticas, ruído falso em frequências para confundir sensores de chakra e rotas de evacuação secreta caso a base fosse checada. Havia custos: a camuflagem exigia recargas frequentes e a manutenção constante do berçário me deixava menos tempo para treino. Cada escolha tinha preço.
E o preço chegava de formas sutis. Em uma manhã acordei com o visor do monitor piscando— uma interceptação de comunicação de baixo nível: jōnins reportavam que um grupo de jovens Uchiha estava sendo chamado para patrulhas extraordinárias. Hiruzen, segundo as transcrições que Alpha X pegou, ordenara observação cuidadosa, "sem alarde, sem acusações prematuras". A tensão política aumentava como algo fermentando; instruções de contenção e comunicação cuidadosamente orquestradas.
Minha preocupação crescente era dupla: a necessidade de continuar treinando para o massacre Uchiha e, simultaneamente, proteger o bebê. Reservas de energia haviam de ser divididas entre manutenção do berçário e sessões curtas, eficientes de prática no Campo de Adaptação. Reduzi as horas de treino mas aumentei a intensidade. Ensaiava combinações rápidas de proteção — Bedrock para dividir, Luz para desorientar, Vazio para abrir rotas — e marcava rotas de retorno à base em segundos.
Em uma noite, ao segurar Naruto enquanto inspecionava os mapas, senti o peso de uma decisão que não tinha volta. Hiruzen, em Konoha, também tomava decisões que afetariam vidas. Em um dos relatórios interceptados, o Hokage ordenava que qualquer evidência de infiltração ou manipulação fosse tratada com prioridade máxima, mas que se evitasse alimentar rumores que pudessem inflamar facções. Ele queria estabilidade, proteção e, acima de tudo, preservar a aldeia.
Fechei os olhos por um momento e sussurrei para o bebê, sentindo a respiração dele contra o meu queixo. Em pouco tempo teria de agir — tanto contra a trama que se formava na vila quanto para impedir a carnificina que vinha na sombra das rivalidades. Preparei o Cajado dos Elementos ao alcance das mãos, revisei mentalmente o protocolo para o massacre Uchiha e salvei cópias dos planos em núcleos isolados da base.
O santuário oculto era seguro por enquanto. Mas por baixo da rotina de fraldas e mamadeiras, o relógio corria mais alto. O mundo lá fora já se movia — com Hiruzen puxando cordas e a ANBU vasculhando sombras. Eu tinha um bebê nos braços e um plano na cabeça. Era hora de escolher com precisão: quando intervir, como intervir e, sobretudo, a quem confiar quando a poeira baixasse.
A contagem regressiva continuava. As próximas horas decidiriam não apenas a sobrevivência de uma família, mas o rumo de toda Konoha.