"Isso depende intrinsecamente da natureza do alvo..." Yue Yang respondeu, suas sobrancelhas se franzindo levemente em uma expressão de consideração genuína. Ele percebeu que a pergunta ia além das ferramentas; era um teste de filosofia, de compreensão da psique humana.
"Suponha que o alvo seja um Mercenário", o velho propôs, sua voz um sussurro rochoso que parecia emanar das próprias sombras da sala.
"Então... eu escolheria o papel em branco." A resposta de Yue Yang foi acompanhada por um sorriso casual, mas seus olhos estavam afiados. "Um mercenário vive de código, confiança e, acima de tudo, de ganância. A lâmina é uma ameaça direta que uniria seus companheiros contra um inimigo comum. O espírito é poder demais para um simples assassino, atraindo atenção indesejada. Mas o papel... o papel é insidioso. Falsificaria nele o mapa de um tesouro lendário – digamos, a localização da Tumba do Primeiro Imperador ou os diamantes-sangue de Karakhum. Entregaria ao alvo com um teatro de segredo e depois espalharia rumores com a precisão de um veneno de ação lenta. A ganância faria o trabalho por mim. Seus próprios irmãos de armas o esfaqueariam pelas costas por uma riqueza que nunca existiu. A discórdia é uma arma mais afiada que qualquer adaga."
"Explicite seu método de entrega e a natureza do rumor," o velho pressionou, seus dedos ossudos parando de tamborilar na mesa.
"Encontrá-lo-ia após uma batalha, fingindo ser um curandeiro ou um comerciante de saques. Ofereceria o mapa como pagamento por uma dívida imaginária ou como agradecimento por salvar a vida de um 'parente'. O rumor começaria em uma taverna distante, de um bêbado que jurou tê-lo visto estudando um pergaminho antigo. Em uma semana, toda a guilda saberia. Em duas, ele estaria morto."
O velho permaneceu imóvel por um longo momento. "Hmm. No próximo teste, suponha que o alvo seja um Mercador Mestre da Guilda de Comércio de Âmbar. Homem cauteloso, rodeado de guarda-costas dia e noite. Ele nunca aceitaria um documento de um estranho."
"O papel em branco, novamente," Yue Yang não hesitou, sua mente trabalhou rapidamente. "Mas não lhe seria entregue. Seria descoberto. Plantaria meticulosamente um diário contábil falsificado em seus arquivos, mostrando um desvio monumental de fundos da guilda – digamos, 10.000 peças de ouro desviadas para uma conta fantasma em um banco de Maré-alta. As evidências levariam até seu contador mais confiável, que seria, naturalmente, um agente que eu forçaria para para 'confessar' sob pressão. O próprio conselho da guilda, consumido pela paranoia e pela ganância, o julgaria e executaria para recuperar o ouro que nunca foi roubado. A burocracia e a ganância dos outros são carrascos muito eficientes."
Desta vez, as mãos finas e nodosas do velho, que repousavam sobre a mesa, ficaram completamente imóveis. Ele fitou Yue Yang, e pela primeira vez, um leve brilho de algo que se assemelhava a um respeito perverso acendeu-se nas profundezas de seus olhos escuros. "Intrigante. E se o alvo fosse um Alto Oficial do Ministro da Justiça? Um homem incorruptível, imune a subornos, cuja única fraqueza é sua devoção fanática à lei e ao imperador. Ainda assim, o papel?"
"Mais do que nunca," Yue Yang sorriu, um sorriso frio e calculista. "Um decreto imperial falsificado, mas não ordenando sua morte. Ordenaria sua promoção. Para um posto de governador em uma província remota e assolada pela peste, efetivamente um exílio glorificado. O decreto elogiaria sua integridade como 'muito valiosa para ser desperdiçada na corte' e 'necessária para trazer a luz do imperador aos cantos mais sombrios do império'. Enquanto ele estivesse atordoado pela notícia, sua família em pranto e sua carreira em ruínas, eu me aproximaria como um servo enviado para ajudá-lo na transição. Ofereceria uma taça de vinho como um brinde à sua nova nomeação... envenenada com um lento e indetectável 'Lamento da Viúva', que o consumiria durante a longa viagem. Sua devoção o impediria de sequer questionar o decreto. A lealdade pode ser a mais forte das algemas."
O velho abriu os olhos completamente. A centelha tornou-se uma chama de pura e sinistra admiração. Ele observou Yue Yang por um longo momento, sua expressão imperscrutável, mas o silêncio era eloqüente. Finalmente, ele assentiu, uma vez, lento e ponderado. A criatividade amoral e a compreensão profunda da natureza humana do jovem eram assustadoras e inegavelmente brilhantes.
Yue Yang sentiu um surto de presunção interior. Ele estava passando no teste com louvor, nem ele conseguia acreditar nas palavras que saia de sua mente.
O teste já tinha terminado, mas mesmo assim o velho queria extrair o máximo de conhecimento possível desse jovem. Ele ergueu uma garrafa de água e derramou um fino filete no chão de pedra, criando uma poça irregular. "O alvo é uma mulher. A Filha do Espadachim, a espadachim mais talentosa de sua geração. Ela treina num pátio isolado, cercada por mestres de espada. Sua única fraqueza é seu orgulho na linhagem de sua família e sua devoção ao seu pai idoso. Como você a alcançaria?"
Ao ouvir a palavra "mulher", a mente de Yue Yang se voltou imediatamente para a ladra de olhos brilhantes, mas ele rapidamente se concentrou no problema. "O papel, é claro. Ele estudou a poça no chão como se fosse um mapa. "Falsificaria uma carta de um historiador rival, questionando publicamente a linhagem de sua família, alegando que seu avô famoso havia roubado suas técnicas de espada de um mestre que ele assassinou. A carta 'vazaria' para ela. Seu orgulho ficaria ferido, sua devoção ao pai o transformaria em uma necessidade obsessiva de defender a honra da família. Ela sairia de seu isolamento para confrontar o historiador, tornando-se vulnerável durante a viagem. Ou, melhor ainda, o estresse causaria uma discórdia fatal entre ela e seu pai, se ele tentasse acalmá-la. A honra é uma corda que pode ser usada para enforcar alguém."
"E se ela aceitar a acusação como falsa e simplesmente queimar a carta?" o velho pressionou, um desafio final em sua voz.
"Desta vez, nenhuma falsificação. Escreveria uma carta de amor sincera" Yue Yang disse isso com um falso ar de pesar.
"E se ela aceitar?" o velho pressionou.
Yue Yang iluminou-se instantaneamente, toda a falsa tristeza evaporando. "Se ela concordar em me amar, por que eu a mataria? Eu a levaria para casa e a desposaria! Uma esposa bela é um tesouro maior que qualquer recompensa!"
"...." Pela primeira vez, o velho parecia verdadeiramente sem palavras. Ele havia vivido incontáveis décadas, testemunhou a podridão da humanidade, mas a combinação de calculismo absoluto e pela criatividade de suas ações era algo fantástico.
Ele ficou em silêncio por um longo momento, o ar pesado com o peso das tramas que Yue Yang havia urdido. Finalmente, ele fez sua pergunta final, sua voz um sussurro áspero. "Última questão. A mais importante. Você recebe uma missão dourada. O alvo é um familiar seu."
O sorriso de Yue Yang não vacilou, mas seus olhos escureceram, tornando-se frios e planos como um lago congelado sob um céu de inverno. Todo o calor e leviandade que ele havia exibido anteriormente evaporaram-se, substituídos por uma frieza absoluta.
"Ancião," disse Yue Yang, sua voz baixa e plana, sem emoção, "existem apenas dois tipos de pessoas no meu mundo: aquelas que vivem e aquelas que estão mortas. Os que eu chamo de meus pertencem ao primeiro grupo. Qualquer um que tentar machucá-los, seja um cliente, um imperador ou a própria Guilda dos Assassinos... se tornará o segundo grupo. Eu queimaria o mundo e semearia sal em suas fundações antes de permitir que tal missão fosse cumprida. Pontos cegos?" Ele deu um passo à frente, e pela primeira vez, uma fração de seu poder [Inato] vazou para a sala, fazendo com que as chamas das lamparinas se curvassem e tremessem. "Chame-os de alicerce. Eles são a razão pela qual eu sobrevivo, e a razão pela qual eu me tornarei forte o suficiente para esmagar qualquer um que os ameace. O amor não é uma fraqueza; é a forja na qual a verdadeira invencibilidade é temperada."
O velho fitou Yue Yang, e o sorriso estranho e distorcido que surgiu em seus lábios finos não era de desdém, mas de profundo e antigo reconhecimento. Ele não viu um tolo sentimental, mas um potencial tão vasto e perigoso quanto um abismo.
"Excelente," o velho sussurrou, a palavra quase perdida no ar. Ele se moveu, deslizando não um, mas dois objetos através da mesa. Um era o [Mapa da Rosa Sangrenta]. O outro era um pequeno pingente de ferro negro, sem ornamentos, na forma de uma lágrima gotejante. "O mapa é para rastrear os assassinos comuns. Isto... é para aqueles que entendem que a verdadeira arte não está na morte, mas na manipulação da vida. Use-o com sabedoria... ou ele o consumirá."
Yue Yang pegou ambos, sentindo o peso frio do pingente em sua palma. Ele saiu da Guilda dos Assassinos não apenas como um membro qualificado, mas como um novato que havia impressionado profundamente um mestre ancião. O teste havia sido muito mais do que simples; havia sido uma revelação.
O mapa, uma fina lâmina de metal escuro gravada com runas intrincadas, poderia ser absorvido por seu grimório, fornecendo atualizações contínuas. Mesmo sem o grimório, ele poderia ativá-lo uma vez ao dia. À noite, revelaria os alvos – assassinos marcados para vingança – como pontos vermelhos pulsantes. Ao selecionar um, o ponto se expandiu, marcando a localização exata do alvo com o símbolo de uma rosa sangrenta.
Os alvos eram assassinos que haviam atraído a ira de suas vítimas a ponto de um "Pergaminho de Vingança" ser ativado com seu último suspiro, registrando sua imagem e condenando seu nome a esta lista. Famílias enlutadas podem adicionar recompensas, e os Caçadores de Vingança tinham seis meses para coletá-las.
Yue Yang não se importava com a justiça. Ele queria o mapa útil e via os assassinos procurados não como pessoas, mas como recursos – combustível premium para os requisitos evolutivos de sua Flor Espinhosa Cuspidora.
Com o mapa em mãos, Yue Yang iniciou seu primeiro trabalho. Seu alvo era um homem chamado "Rocha". Yue Yang não sabia – ou se importava – com seus crimes específicos, apenas que oito famílias haviam reunido uma recompensa de 5 moedas de ouro por sua cabeça. Para Yue Yang, era um treino perfeito.
Enquanto seguia o ponto vermelho pulsante no mapa metálico, uma onda de nostalgia inesperada atingiu Yue Yang. A cidade adormecida ao seu redor, envolta em silêncio e sombras, era um mundo longe da cálida tranquilidade de seu quarto. Neste exato momento, Si Niang provavelmente estava dormindo profundamente, seus cabelos espalhados sobre o travesseiro, talvez murmurando seu nome em um sonho.
Ele podia quase sentir o calor do corpo dela contra o seu, a suave curva de sua cintura sob sua mão, a paz profunda e respiratória que eles compartilhavam nas horas mais escuras da noite. Era um contraste gritante com a missão sombria que agora empreendia, perseguindo um homem para matá-lo por um punhado de ouro. Um suspiro quase inaudível escapou de seus lábios. Logo estarei em casa, prometeu a si mesmo, e a imagem dela, serena e confiante em seu sono, o preencheu com uma determinação renovada para terminar o trabalho rapidamente.
Rocha, confiante e arrogante, não se incomodava em se esconder. Ele se escorava em uma taverna, consumindo vinho amarelo barato como se não tivesse preocupações no mundo. Achava que sua força e conexões com um político influente o protegiam. Quem se importaria com uma recompensa de apenas cinco peças de ouro? Ele havia traído e matado alguns companheiros mercenários por um saque maior. Um negócio simples. Ele já fantasiava em encontrar as viúvas de seus ex-companheiros depois... isso certamente silenciaria qualquer noção restante de vingança.
Ele estava quase inconsciente com a bebida, inchado de orgulho doentio, convencido de sua própria invulnerabilidade.
Em sua mente embotada, os planos para a noite já estavam traçados. Aquele bordel na Rua do Lótus, talvez, ou a residência do mercador Shi – diziam que sua filha mais nova tinha a pele suave como seda e um medo que tornava o sabor da conquista ainda mais doce. Ele escolheria uma casa, qualquer uma, e teria seu divertimento. Quem ousaria impedir um Invocador como ele? A vingança daqueles camponeses insignificantes era uma piada, uma mosca irritante que ele podia esmagar a qualquer momento.
Foi então que uma figura surgiu na entrada da rua escura, cortando seus devaneios de violência e prazer. Esguia, vestida de preto, com o rosto oculto por uma máscara. Os olhos por trás da máscara, no entanto, não eram os olhos assustados de uma vítima ou os olhos bajuladores de um subordinado. Eles brilhavam com uma luz intensa e focada, completamente impessoal, refletindo a fraca luz da lanterna como dois pedaços de gelo polido. Era o olhar de um predador, não de uma presa.
A arrogância de Rocha vacilou, substituída por um frio súbito que não tinha nada a ver com a noite. Os planos de invadir quartos e achar graça do medo alheio evaporaram-se. Aquele não era o tom de um homem perturbando outro por engano. A voz que cortou o silêncio foi clara, calma e carregada de uma intenção inconfundível.
"Eu achava que você seria mais assustador," a voz disse, tão afiada quanto uma lâmina. "Porém, é só um porco fedido?"
Era o tom de um caçador confirmando sua presa. E, pela primeira vez naquela noite, Rocha não se sentiu como o caçador.