Ficool

Chapter 7 - Capítulo 7 – Amigos ou Inimigos

Depois que saí da sala de jantar, caminhei pelo longo corredor do enorme castelo em silêncio. Não tinha nada de novo para fazer, além de ficar entediada com meus próprios pensamentos. Às vezes me pergunto por que, diabos, meu pai idiota me mandou pra cá para me tornar noiva do príncipe herdeiro — mesmo sabendo que eu sou uma peste que nunca levou desaforo pra casa em toda a minha vida. Nem quando a Raquel tentou me matar, naquela época.

Parei em frente a uma janela aberta que dava para um belo jardim, com montanhas ao fundo, uma floresta densa e um imenso lago bem no centro de tudo — refletindo a luz da manhã como se aquilo tudo fosse perfeito. Observei alguns servos indo de um lado pro outro, fazendo a mesma rotina de sempre. A mesma que tenho observado desde que fui chutada pra cá, como se eu fosse um pedaço de merda.

Cruzo os braços e franzo a testa, sentindo um fio de suor escorrer pela minha pele. Era sinal claro de tensão. Eu já tinha percebido, desde a sala de jantar, que algumas garotas estavam me seguindo de longe. E agora estavam aqui, prontas pra tirar satisfações.

Três garotas me cercaram — justamente as mesmas que eu acusei de terem invadido o quarto do príncipe herdeiro. Cada uma parou em um ponto ao meu redor, me encarando com uma raiva mal disfarçada.

— Então... o que será que devemos fazer com você? — pergunta a primeira, com um jeito meio sem noção.

— Não sei, só sei que devemos nos vingar! — responde a segunda, quase rosnando.

— Vocês duas são umas malas sem alça — interrompe a terceira, com um olhar mais racional. — Ela pode muito bem contar tudo à Vossa Alteza sobre o que fizermos. E também tem aquela tal de Melody Willians... vocês sabem que isso pode acabar em julgamento.

As duas primeiras trocam olhares, finalmente parando pra pensar. Eu, por outro lado, apenas observo em profundo silêncio. Que as duas eram burras, isso já estava claro — mas quem diria que a terceira garota teria o mínimo de inteligência?

Fico encarando a terceira garota com mais atenção. O nome dela era Ruby Baltazar, filha legítima do Alfa Nêmesis Baltazar, ao Oeste de Céu Noturno. Seu território era conhecido como Escuridão Profunda, uma região onde o lema da matilha era simples: inteligência acima de tudo. Todos ali nasciam com uma mente afiada — diferente da maioria das outras matilhas.

Se eu me lembro bem, Raquel também veio desse território. Mas, por algum motivo, mesmo sendo de família nobre, resolveu abandonar tudo para correr atrás de um amor não correspondido. História velha, claro. Já ficou no passado.

Ruby, por outro lado, parecia saída direto de um quadro de realeza. Tinha a aparência de uma verdadeira rainha da alta nobreza: olhos vermelho-sangue, cabelos lisos até a cintura tão pretos que talvez fossem ainda mais escuros que os meus. A pele era branca como porcelana. Usava um vestido preto que, sinceramente, não combinava em nada com sua pose de nobre. E os saltos pretos que calçava a deixavam quase da minha altura — embora ainda fosse mais baixa que eu, com seus 1,65.

Ela percebe que estou encarando.

— Algum problema? — pergunta, inclinando a cabeça em minha direção com um olhar sério.

— Bem, você está atrapalhando o meu caminho — respondo sem papas na língua.

Ela arregala levemente os olhos, visivelmente furiosa com a resposta.

É... às vezes eu falo de forma ignorante sem nem perceber que fui realmente ignorante.

— Bem, você deve ser a tal Celestia Addans, a famosinha desde o primeiro dia. — Ruby comenta com um ar superior. — Chegou aqui feito uma verdadeira puta... e já conseguiu atrair a atenção do príncipe.

Por um breve momento, a expressão dela, o tom arrogante, me fazem lembrar do meu pai. Aquele maldito tinha o mesmo jeito. Uma veia pulsa forte na minha testa.

— Às vezes é sempre bom ficar calada — murmuro, me aproximando até ficar face a face com ela.

Meus olhos, normalmente azuis como o céu, escurecem em um tom quase assassino. Uma aura sinistra se espalha pelo ar, fazendo Ruby perder o ar de superioridade. Ela dá um passo para trás, hesitante.

— Você deveria conhecer o seu lugar — continua ela, tentando manter a pose. — Sendo filha ilegítima do seu pai... você nem era pra estar aqui.

Meus olhos se arregalam.

Franzo a testa.

A raiva dá lugar à confusão.

Como ela sabe disso? Essa informação nunca deveria ter saído do território de Céu Noturno... nem mesmo os servos ousariam espalhá-la.

— Como você sabe disso? — pergunto, minha voz afiada. Seguro o ombro dela com força. — Quem te contou isso?

Começo a chacoalhá-la com força, como se fosse um trapo velho de pano, o sangue fervendo, o coração batendo com fúria.

— RESPONDE! — exijo, enquanto a expressão de Ruby finalmente mostra algo novo: medo.

Mas acabo sendo impedida quando Oliver aparece, se colocando entre nós duas com um olhar de puro pânico.

— O que está acontecendo aqui? — pergunta ele, olhando direto pra mim, como se já soubesse de quem viria a confusão.

— Nada. — responde Ruby, seca. Seu olhar de desafio já não estava mais lá. No lugar, só restava um incômodo mal disfarçado.

Ela vira o rosto com elegância forçada.

— Vamos, garotas.

As duas que antes só assistiam tudo em silêncio imediatamente a seguem, como se Ruby fosse a verdadeira rainha dali e elas, suas fiéis servas.

O silêncio que ficou foi quase incômodo. Fiquei parada ali, tentando juntar os pedaços do que tinha acabado de acontecer. Minutos se passaram até que Oliver finalmente quebrou o clima.

— Está tudo bem?

Ele me observa, visivelmente preocupado.

— Sim, está tudo bem — respondo em um sussurro fraco. Mas a verdade é que nada estava bem.

Por dentro, eu estava em pânico.

Se todo mundo descobrisse que eu era filha ilegítima de Erike Addans, eu seria não só expulsa do castelo, mas também exilada da minha própria matilha — mesmo sem nunca ter contado esse segredo pra ninguém.

E se o rei soubesse? Eu iria direto pra julgamento. De frente com Melody Willians, a juíza surpresa da corte dos lobos. Ela era temida por todos.

Meu pai também seria julgado. E perderia o posto de alfa que manteve por mais de dois mil anos. De alguém grande... para um completo nada.

Porque trair seu parceiro, na nossa sociedade, é considerado ilegal. A lei foi decretada pelo próprio rei.

Se você traiu com um humano, a sentença é morte.

Se foi com outro lobo, é exílio.

E se você for um alfa, seu título é automaticamente revogado.

Aperto meus braços com força, ainda presa no redemoinho dos meus próprios pensamentos. Só saio dele quando Oliver toca meu ombro. Seu olhar ainda estava preocupado, e o toque... era gentil, quase cheio de compaixão.

— Tem certeza? — ele pergunta mais uma vez, encarando meus olhos.

— Sim, está tudo bem — respondo, desta vez com a voz mais firme. Mas meus braços ainda estavam tensos, apertando a mim mesma como se isso pudesse manter o caos sob controle.

Dou um passo rápido para trás, me afastando dele. Eu precisava encontrar Ruby. Precisava de respostas. Ela sabia demais. E Oliver tinha aparecido na hora errada, interrompendo tudo.

Comecei a andar pelo castelo como uma tempestade prestes a desabar, vasculhando cada corredor, cada canto, cada pátio. Levei um tempo — talvez tempo demais — mas finalmente a encontrei.

Lá estava ela. Atrás de uma árvore, no jardim do castelo. E com suas duas fiéis serviçais.

Mas o que realmente chamou minha atenção foi o que estavam fazendo.

Elas estavam fazendo bullying com Jade.

Jade estava ajoelhada no chão, chorando como uma criança — as lágrimas escorriam com tanta dor que meu estômago revirou. As outras três riam, debochavam.

Foi como se algo acordasse dentro de mim.

Uma raiva quente, crua, animalesca.

Sem pensar, corri em direção a elas.

E sem hesitar, acertei um soco no rosto de Ruby, que caiu de lado no chão com um grito abafado. As outras duas recuaram com os olhos arregalados e fugiram, como boas covardes que são.

Ruby, no chão, levava a mão à face — o ponto exato onde meu punho bateu. Seus olhos se encheram de lágrimas enquanto me encarava, sentindo a dor. Ela não era tão durona agora.

— Escuta aqui... — comecei a dizer, pronta para despejar em cima dela tudo o que estava entalado.

Mas fui impedida.

Desta vez por Jade, que me segurou por trás com os braços tremendo.

— Não, Celestia! Não bata nela! — implorou, com pânico no olhar.

Fiquei paralisada.

Virei-me para encará-la, confusa e furiosa.

— Por que não?! Ela estava fazendo bullying com você!

Jade me soltou no mesmo instante. Mas ao olhar bem para ela, algo me pareceu estranho.

Não havia um arranhão. Nenhuma sujeira. Nenhuma lágrima real.

Sua roupa estava perfeita, seu cabelo no lugar, o rosto limpo.

Aproximei-me mais, tentando entender.

Aquilo não fazia sentido.

— Ela não fez nada de errado comigo! Ela só tentou me ajudar, só isso! — disse Jade, com a voz apressada.

Franzi o cenho. Aquilo tudo estava ficando cada vez mais estranho.

— Ajudar com o quê? — perguntei, cruzando os braços.

Jade ficou vermelha na hora, desviando o olhar.

— Me ajudar a levantar do chão... eu estava andando e lendo ao mesmo tempo, com um livro nas mãos, e acabei batendo de frente com ela sem querer...

Ela parecia tímida, quase envergonhada. Mas algo não batia.

Não tinha nenhum livro com ela. Nenhum sinal de que tinha caído ou sujado.

— E o livro? — perguntei, desconfiada.

Jade apontou para trás.

Virei o rosto e vi Ruby se levantando do chão, ainda com a outra mão livre... e segurando um livro.

Ela me encarou em silêncio por um segundo, depois estendeu o livro em minha direção sem dizer uma palavra.

Peguei o livro. Ruby passou por mim em silêncio, com dignidade ferida, e desapareceu de vista.

Olhei para o objeto em minhas mãos... e então, sem pensar muito, bati levemente com ele na cabeça da Jade. Não doeu — mas foi o suficiente pra ela prestar mais atenção.

— Ai! — fez um biquinho. — O que foi que eu fiz agora?

Revirei os olhos, sem saber se ria ou suspirava.

No fim, acabamos saindo do jardim lado a lado, eu e Jade, em silêncio.

Mas mesmo com o sol batendo, com o jardim calmo e Jade distraída ao meu lado, eu não conseguia parar de pensar:

Como Ruby sabia do meu segredo?

Quem contou a ela que eu sou filha ilegítima?

Aquilo... ainda estava entalado na minha garganta.

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