Ficool

Chapter 2 - Capítulo 2 – Conflito

E entrei.

Assim que cruzei a porta, recebi logo de cara aquele olhar mortal do meu querido pai idiota. Ele bufava alguma coisa que eu não fazia a menor questão de ouvir — e, como sempre, ignorei como se não fosse nada.

Há séculos acompanho essa mesma expressão desprezível e nojenta dele. Ele nunca fez esforço pra esconder o quanto é um grande babaca.

Se fosse em outra época, eu teria simplesmente aberto a boca e soltado uma daquelas frases que o fariam espumar de raiva.

Como naquela vez… no aniversário do rei dos lobos.

Estava acontecendo um grande banquete. O velho colocou sua melhor roupa — toda bordada, cheirando a ego inflado — e, como filha do líder, eu tinha que ir junto.

Na época, eu era só uma criança excluída que não queria estar ali. Mas fui obrigada a ir com ele… na mesma carruagem.

Sim, você não leu errado. "Carruagem."

Ele fazia questão daquela aura de nobreza. Tentava se igualar ao rei dos lobos com aquelas roupas ridículas e pompa forçada.

E como vingança… resolvi humilhá-lo. Em público.

Assim que chegamos ao castelo, nossos nomes foram anunciados:

— Erike Addans e sua filha, Celestia Addans!

Ele sorriu, todo arrogante, como se fosse a estrela da noite.

Foi aí que minha alma travessa brilhou. Fiz uma expressão de puro desgosto e discretamente coloquei o pé na frente dele.

E adivinha?

Cheio de si, nem notou.

No primeiro passo… tropeçou. Caiu escada abaixo, rolando como um saco de esterco diante da alta nobreza.

O salão inteiro ficou em choque. Em segundos, cochichos começaram a se espalhar. Risadas contidas… até que alguém explodiu.

O rei.

Aquele riso alto, cheio, ecoando no salão como um trovão debochado.

Dava pra ouvir por horas. E eu?

Eu ria horrores no topo da escada, com um prazer tão grande que até hoje guardo aquele momento como um troféu.

O idiota levantou a cabeça, vermelho de raiva, olhou para o rei com vergonha… e então virou pra mim.

Me viu rindo.

Debochada. Orgulhosa. Vitoriosa.

Desde aquela época, ele nunca mais me levou a nenhuma festa. Medo de ser humilhado de novo em público.

Claro que eu fiz questão de fazer aquilo com estilo — com bom gosto, como diria Elisa — só pra ver se o ego inflado dele aprendia a descer um degrau.

Voltando ao presente…

Enquanto eu estava ali, perdida em pensamentos, o velhote bateu com força na mesa, fazendo a madeira rachar.

Pelo visto, ficou vermelho de raiva. Tentando, mais uma vez, chamar minha atenção.

Ele odeia quando eu fico no mundo da lua. Sempre odiou.

Reclama de tudo. Parece uma mulher de TPM, mas ao invés de cólicas e chocolate, ele vem com grunhidos, sermões e aquele ar de superioridade que me dá náuseas.

Pra evitar ouvir a enxurrada de merda que sai da boca dele, eu aplico a minha tática preferida: ignorar.

Ignorância é uma bênção, e ele sabe disso.

O que só o deixa ainda mais furioso.

Às vezes acho que ele só não me dá um tapa na cara porque, bem… tecnicamente, sou filha dele. E ele tenta manter a pose de pai frio.

Reviro os olhos só de imaginar ele forçando esse papel ridículo de "pai distante e desapontado", estilo lobo traumatizado da literatura.

Mas eu?

Eu sou o oposto disso tudo.

Eu sou o tipo de filha que, se ele resolver brincar de pai gelado e ausente, posso transformar a vida dele em um inferno real.

E ele sabe disso.

Conhece bem minha personalidade.

Por isso nem tenta ser mais babaca do que já é.

Então, finalmente, o velho fala, cheio de fúria, com a voz quase trovejando pela sala:

— Eu não sei como ainda não lhe dei uns tapas!

Ele resmunga alto, só para garantir que eu ouça claramente. E, como uma boa filha que sou — com um toque especial de insolência — respondo na lata, olhando direto nos olhos dele:

— Ué, não é porque eu sou a filha do Alfa e devo agir como tal? Afinal... isso não mancharia sua preciosa reputação se eu aparecesse em público cheia de hematomas?

Dou um sorriso irônico, lento, bem na direção dele. Aquele tipo de sorriso que o faz ranger os dentes. Porque, sim, isso seria o fim da imagem de poder dele — e da matilha "Céu Noturno" também. Somos conhecidos por sermos orgulhosos demais para admitir qualquer erro. Imagina a vergonha pública se soubessem que o grandioso Alfa agride a própria filha? Ah, seria um escândalo delicioso. E ele sabe disso.

No fundo, o desgraçado não me toca não por amor, mas por puro medo. Medo de mim, da minha língua afiada, da minha reputação entre as outras matilhas e do caos que eu sou capaz de causar.

Ele respira fundo. Muito fundo. Claramente tentando não explodir. Quase sinto pena — quase. E então, com a paciência artificial que ele finge ter, finalmente solta a bomba:

— Bem... eu te chamei aqui por um único motivo. O Rei mandou uma carta para cada Alfa, solicitando que enviem suas filhas — as que têm a mesma idade do príncipe — para o castelo. Ele quer escolher entre elas a futura princesa.

Silêncio.

Fico apenas encarando aquele rosto envelhecido pelo orgulho e pela raiva contida. Por alguns segundos, só o som do relógio marcando o tempo pode ser ouvido. Então eu quebro o silêncio com minha voz neutra, arrastando cada palavra com desdém calculado:

— Tá, mas o que isso tem a ver comigo?

Mesmo já sabendo exatamente a resposta, faço questão de perguntar. Porque quero ouvir da boca dele o absurdo que vai sair. Quero ver sua expressão quando perceber que me enfiar nessa palhaçada real vai ter um preço. Alto.

Vejo uma veia saltar na testa do meu pai, que respira fundo outra vez. Com aquele olhar mortal fixo em mim, ele solta, firme e direto:

— Não se faça de idiota, você sabe muito bem disso, mocinha.

Arqueio uma das sobrancelhas, cheia de deboche, e cruzo os braços. “Mocinha”? Sério? Às vezes me pergunto que porra ele acha que está falando comigo.

Eu até poderia esperar ser chamada de “mal criada”, “infeliz” ou qualquer outro xingamento à altura. Mas “mocinha”? Isso é novidade.

Nem perco tempo respondendo, porque sei que é conversa perdida. Provocar ele seria desperdiçar energia e testar minha sorte — e essa eu prefiro guardar pra momentos melhores.

— Amanhã vai chegar uma carruagem do rei para buscá-la. Quero que esteja pronta antes dela aparecer, entendeu? — ele diz, voz dura, não aceitando discussão.

Fico encarando ele por um bom tempo, até que suspiro e aceno com a cabeça, aceitando meu destino.

Só de pensar que tenho que acordar cedo para esperar essa carruagem — que ninguém sabe a que horas exatamente vai chegar — já me irrita.

O território do “Céu Noturno” fica a quatro horas de distância do reino do rei “Noite Estrelada” — ida e volta.

Minha expressão muda, dominada por aquela raiva e arrogância que herdei do idiota do meu pai.

Fico imaginando todo meu corpo dolorido depois dessas horas intermináveis dentro daquela carruagem…

E, claro, a vergonha de ter que me encaixar naquele mundo de príncipes e princesas, onde eu mal consigo me segurar para não revirar os olhos a cada minuto.

Então me viro e saio da sala do líder, encontrando Eike esperando do lado de fora. Ele me encara com seu único olho, cheio de uma felicidade irritante — parece até que o idiota ouviu tudo atrás da porta.

Sem perder tempo, me aproximo dele e dou um tapa certeiro na cabeça, que o faz cair no chão, completamente surpreso pela ação repentina.

Eu estava com raiva, saindo da sala do líder sem paciência para qualquer provocação vinda daquele sujeito.

Sem dizer uma palavra, sigo pelo corredor, caminhando rápido, com meus pensamentos só para mim.

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