Ficool

Escravo Da Morte

Asmael
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Synopsis
Quando Luciano despertou no mundo dos Caçadores, esperava força, poderes e um caminho rumo à glória. Em vez disso, encontrou dor, sangue... e um contador impiedoso marcando as horas que lhe restam de vida. Sem talentos. Sem Armas. Sem explicações.
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Chapter 1 - O Sussurro do Outro Mundo

Um jovem franzia a testa, os olhos presos no céu cinzento, como se buscasse respostas entre nuvens que se recusavam a se mover.

— Por que eu...? O que foi que eu fiz pra merecer isso? — murmurou.

Estava do lado de fora de casa, mas não havia conforto algum na familiaridade do lugar. O medo apertava seu peito como correntes invisíveis.

Lucian nunca fora o mais corajoso, e agora, estava marcado pelos Sonhos.

Ou seriam... Pesadelos?

O mundo estava desmoronando.

Mas não como nos filmes, com explosões e gritos.

Era algo mais sutil. Silencioso.

Um sussurro constante.

Uma presença invisível espreitando além da percepção humana, corroendo a realidade como traças devorando um tecido antigo.

Anos atrás, a humanidade enfrentou o que chamaram de A Doença do Sono.

Pessoas adormeciam… e não acordavam.

Ou pior, acordavam transformadas em monstros.

Quem morria naquele outro mundo, morria aqui também.

O pesadelo se tornou real quando descobriram que era contagioso.

O mundo quase acabou.

Mas então, eles surgiram, pessoas que voltavam do sono com habilidades sobrenaturais.

Caçadores.

Eles enfrentaram as criaturas. Deram à humanidade uma nova chance.

Mas toda chance vem com um preço.

O mundo não ficou livre. Pelo contrário...

Agora, qualquer um que apresentasse sinais do Outro Mundo era marcado.

Vigiado.

E mandado de volta.

Por ordens da temida Seção Especial de Controle Onírico.

Lucian era um deles.

E o sussurro que corroía o mundo... agora murmurava dentro dele.

---

Antes de se entregar, Lucian se deu um último luxo: um jantar em um restaurante chique no centro da cidade.

O prato principal era carne ao molho de ervas, servida com purê de batata cremoso e legumes caramelizados no vinho.

Cada garfada era quente, macia, um breve abraço para um coração gelado pelo medo.

O aroma de alecrim e temperos frescos quase o fez esquecer onde estava.

A sobremesa chegou: um bolo de baunilha coberto com calda quente de frutas vermelhas e um toque cítrico de laranja.

Na primeira mordida, o doce derreteu na boca como se o tempo tivesse parado só para ele.

Por um instante, Lucian se permitiu esquecer tudo.

Saborear a vida.

Mas a lembrança da Marca voltou como um soco no estômago.

Ele baixou os olhos. Engoliu seco.

O sabor sumiu.

Como tudo mais em sua vida, tirado antes de estar pronto.

Era hora de se entregar.

---

A Seção Especial de Controle Onírico ficava no subsolo do Centro Governamental da Zona Leste, um lugar onde as paredes pareciam observar.

Lucian chegou sozinho. Um segurança de terno cinza, encostado ao lado da porta, ergueu uma sobrancelha.

— Nome? — perguntou, seco.

— Lucian. Eu vim... me entregar.

O homem o observou por um segundo a mais do que o necessário. Então apenas assentiu.

Dois agentes vieram buscá-lo. O levaram por um corredor branco demais, iluminado por lâmpadas que zumbiam como se tentassem abafar o som do mundo lá fora.

Um dos agentes era alto e magro, com olhos frios e distantes. O outro, mais baixo, tinha um cabelo longo, grande, por fazer e uma expressão cansada, mas curiosa.

Entraram em uma sala vazia — uma mesa metálica ao centro, duas cadeiras.

Lucian se sentou. As mãos tremiam.

— Nome completo — pediu o agente alto, sem emoção.

— Lucian Duarte.

— Idade?

— Dezessete...

O homem de cabelos longos se inclinou para frente, os olhos vasculhando cada detalhe do garoto.

— O quanto você sabe... sobre o Outro Lado?

Lucian hesitou. O coração disparou.

A pergunta parecia simples.

Mas o que era simples naquele mundo?

— Eu... — engoliu em seco — Só o que contam por aí. Que é um lugar estranho. Escuro.

Que as pessoas... mudam, depois que voltam.

O agente de barba ainda o observava em silêncio, como se enxergasse além da pele.

Lucian desviou o olhar.

Ser despertado.

Para alguns, era um milagre.

Um dom dos céus.

Uma chance de ganhar dinheiro, fama, viver uma vida confortável enfrentando monstros como se fossem apenas degraus no caminho para o sucesso.

Mas, para Lucian… era uma sentença de morte.

Ele era sedentário.

Anti-social.

Medroso.

Nunca teve um preparo físico decente, tampouco o gosto por combate.

Mesmo na escola, quando as aulas de combate eram obrigatórias, ele sempre arrumava um jeito de sair antes. Fugir era mais fácil que enfrentar.

E diferente das grandes famílias ricas, que podiam comprar armaduras reforçadas, armas de última geração e até mentores particulares, Lucian não tinha nada disso.

Ele só tinha uma arma de segunda mão — uma lâmina antiga que mal reagia ao toque de mana.

Tudo nele gritava: "inadequado".

Mas isso não importava para o sistema.

Despertou? Então, você vai.

Treinado ou não. Pronto ou não.

O Outro Mundo não fazia distinções.

— Uh… não muito.

O policial suspirou.

— Então não temos tempo para o procedimento completo. Tente resistir pelo tempo que puder e ouça com muita atenção. Certo?

Sem esperar por uma resposta, ele acrescentou:

— Quanto você sabe sobre o feitiço do pesadelo?

Lucian o olhou com dúvida.

— Tão bem quanto qualquer um, eu acho? Quem não sabe sobre o Feitiço?

— Não estou falando das coisas extravagantes que você vê nos... filmes, séries, animações e ouve nas transmissões de propaganda... Quero dizer, quanto você realmente sabe?

Essa era uma pergunta difícil de responder.

— Eu só... entro no Reino dos Sonhos, mato uns monstros no Primeiro Pesadelo, ganho uns poderes mágicos e viro Desperto, certo?

O policial franziu a testa, seu olhar pesando sobre Lucian como uma âncora.

— Se fosse tão simples assim, metade da população não teria morrido ou estaria morta… e a outra metade desesperada para nunca ser escolhida.

Lucian sentiu um arrepio percorrer sua espinha.

— Você… está falando sério?

— Estou. Escute, garoto. O que vou dizer pode te salvar a vida, ou te deixar ainda mais ferrado. Mas você merece saber. O Feitiço do Pesadelo não é um teste. Não é um jogo. É uma execução com chances mínimas de sobrevivência.

O silêncio se arrastou por um instante...

E esse silêncio gritou mais alto que qualquer sirene.

Lucian tentou engolir em seco, mas a garganta parecia fechada.

— Mas… se é assim tão mortal… por que ainda fazem isso com a gente?

O policial olhou para os lados, como se temesse que as paredes pudessem ouvir. Depois se aproximou lentamente, inclinando o corpo.

— Porque é a única forma de manter o Outro Lado… contido.

Lucian franziu a testa.

— Contido? Você tá dizendo que somos... oferendas?

— Portas. — ele corrigiu, com um sussurro. — Cada Desperto que sobrevive, sela centenas de outros. Cada um que morre… abre espaço pro pesadelo se expandir.

Lucian sentiu a náusea subir. A cadeira parecia menos estável. O chão, mais distante.

— Isso é... isso é doentio.

— Bem-vindo à realidade, garoto. — O policial recuou, os olhos endurecendo. — Eles chamam de “Despertar”, mas é mais como afundar.

Lucian se encolheu na cadeira, como se a simples ideia de afundar pudesse puxá-lo de verdade.

— Mas... e se eu me recusar?

O policial deu uma risada curta. Sem humor. Quase amarga.

— Ninguém recusa, Lucian. O feitiço já foi selado em você no instante em que foi marcado. Se você ficar e morrer, vai atrapalhar a vida de todos.

A agulha entrou devagar, fria como aço morto.

— Tenta resistir. Só vai piorar se você dormir — murmurou o agente, ajeitando a máscara de contenção sobre o rosto de Lucian.

Luzes vermelhas piscaram na sala.

O som de maquinário pesado se misturava ao zumbido quase hipnótico da energia onírica sendo canalizada.

Lucian piscou uma, duas vezes… e tudo ficou branco.