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Chapter 9 - Capítulo 9: As Correntes Proibidas

Os treinos iam se acumulando, cada dia deixando marcas sutis no corpo e na mente. A água me ensinara paciência; agora eu caminhava por uma borda mais escura. A menção, meses atrás, à manipulação de sangue sempre ficara na sombra das minhas notas. Era tempo de encarar aquilo — com cautela.

No primeiro dia dedicado ao tema pedi a Alpha X um cenário biomimético, alvos com sistemas circulatórios simulados, respostas vitais e proteções inerentes. Ao ativar a sessão, a câmara encheu-se de ruído analítico: padrões de fluxo, pressão, sinais vitais projetados. Era tudo virtual, reconhecia isso, mas o peso da ação estava ali, contundente.

Concentrei o tomoe azul e, pela primeira vez, tentei estabelecer ligação com o líquido vital simulado. Não foi um comando imediato: senti resistência, como uma parede fina que recuava. Em tentativas iniciais apenas alterei pequenos fluxos. Os alvos ficaram atordoados; pulsações irregulares surgiram nas projeções. A sensação dentro de mim era estranha — uma dissonância entre controle e invasão. Quando forcei mais, o campo interno vibrou e eu senti náusea. Alpha X interrompeu automaticamente a simulação, sinalizando risco de sobrecarga neural.

No segundo dia trabalhei a precisão. Em exercícios curtos busquei manipular volumes pequenos, sempre medindo o custo. Descobri rapidamente que a técnica exigia microfoco: qualquer erro, mesmo mínimo, poderia gerar dano irreversível. Em uma falha, um alvo virtual sofreu uma parada simulada que não pude reverter a tempo sem consumir energia demais. O sentimento de responsabilidade apertou o peito. Não era apenas poder; era interferência direta na vida alheia, ainda que em simulacro.

Durante o terceiro dia experimentei variações. A chamada Blood Weaponization apareceu em pensamento — a ideia era transformar o fluido em formas contundentes. Consegui criar projeções cortantes de água-sangue, mas eram instáveis e drenavam meu chakra com violência. Alpha X registrou a eficiência e o risco: utilizável em último caso, com alto custo e possibilidade de efeitos colaterais imprevisíveis.

Também explorei uma vertente menos letal: usar o fluxo interno do próprio corpo para acelerar curas internas. Em simulação controlada, direcionei energia para concentrar sangue em áreas lesionadas do modelo. A restauração parcial ocorreu, mas ao preço de uma exaustão física intensa: minha visão ficou comprimida por minutos depois da sessão, os ouvidos zuniram e senti um cansaço que tirou a força dos meus músculos por horas. Alpha X recomendou limites estritos e períodos longos de recuperação.

Ao longo da semana os treinos foram do desconforto à margem de controle. Em cada progresso havia um preço: dores de cabeça pós-sessão, palpitações, visões fugazes de pulsos e veias. A parte moral pesava mais a cada sucesso técnico. Eu sabia que, mesmo em defesa de algo maior, cruzar certos limiares poderia me transformar no que mais queria evitar.

Num dos dias, após encerrar o exercício, Alpha X enviou uma notificação externa com tom de prioridade baixa mas preocupante: aumentaram relatos de desmaios isolados entre trabalhadores noturnos próximos à maternidade onde Kushina permanecia. Não havia ligação direta — apenas coincidências estatísticas — mas a correlação chamou atenção. Em seguida, Alpha X exibiu um aviso: meus treinos de manipulação de fluxos energéticos haviam gerado emissões discretas detectáveis em frequências baixas; a base recomendava reduzir as sessões noturnas para evitar ruídos que pudessem ser captados por sensores externos.

A frase ficou ecoando em mim. Mesmo com toda discrição, havia um risco de deixar pistas. A técnica era poderosa, provavelmente decisiva em um confronto extremo, mas cada uso aumentava a chance de ser percebido — e de causar dano irreversível a alguém que eu jurei proteger.

No último dia daquele ciclo absorvi tudo o que havia aprendido em um único exercício curto e contido: não forcei intensidades máximas, apenas testei limites seguros. Ao finalizar, senti as pernas bambas, e por um instante vi, em visão periférica, padrões vermelhos dançarem na minha frente. Respirei fundo e agradeci mentalmente a Alpha X por interromper automaticamente quando os sinais de exaustão atingiram níveis críticos.

Enquanto fechava os registros, uma sensação sombria se acomodou: ter a opção de algo proibido trazia uma responsabilidade que não se apagava. Salvei as configurações básicas como "uso de último recurso", e marquei intervalos de recuperação obrigatórios. Escrevi mentalmente um protocolo de ética que prometi seguir.

Se eu precisava de uma última confirmação, veio na forma de um alerta secundário vindo de Konoha: patrulhas noturnas relataram um caminhante noturno encontrado desmaiado perto de um riacho, sem ferimentos externos. Nada conclusivo, apenas mais um dado no mar de sinais. A coincidência deixou um gosto amargo. A maré da história podia reagir às minhas ações de maneiras imprevisíveis.

Fechei os olhos, sentindo o peso de possibilidades que eu preferia não ter. A técnica existia agora dentro do meu repertório, mas antes de usá-la eu teria que merecê-la — e ter certeza de que o preço não seria maior do que o que eu jurara proteger.

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