Objetivo da história:
Decidi criar uma história original inspirada no universo brutal e filosófico de Baki. A trama se passa no ano de 2021, um período onde as lutas clandestinas voltaram a dominar os becos das grandes cidades e os ringues ilegais se tornaram arenas de guerra entre os homens mais perigosos do planeta.
O nome da história é CAGE:2021 — um título que carrega o peso da violência, da honra e da selvageria contida dentro de uma jaula. Em um mundo onde a força física ainda dita as regras em certos círculos ocultos da sociedade, CAGE:2021 mergulha no submundo das artes marciais extremas, onde não há juízes, regras ou misericórdia. Apenas um instinto: vencer ou morrer.
O foco será em personagens insanos, com passados intensos e estilos de luta únicos. Uma nova geração de guerreiros surge, enquanto lendas esquecidas voltam à tona. E em meio ao caos, surge um novo torneio — brutal, ilegal e global — que promete coroar o ser humano mais próximo de uma arma viva.
CAGE:2021 – IntroduçãoJapão, Porto de Osaka. Ano de 2021.
As engrenagens do guindaste chiavam enquanto o sol surgia no horizonte, refletindo nas águas turvas do porto. O cheiro de ferrugem, sal e suor era parte da rotina. Entre os trabalhadores adultos, havia um garoto de 14 anos, com mãos calejadas, olhar duro e silencioso: True Lookiu Hagai, ou simplesmente True Hagai.
Nascido e criado na parte esquecida de Osaka, True conheceu a miséria desde pequeno. Sua mãe, que trabalhava limpando navios, faleceu três anos antes — vítima de uma doença que ninguém se importou em diagnosticar até ser tarde demais. Ele nunca conheceu o pai. O único legado que recebeu foi o próprio nome e um corpo que parecia ter nascido para a guerra.
True não era como os outros garotos da sua idade. Seus músculos eram duros como cordas, moldados pelo trabalho braçal e pela fome constante. Não havia escola, brincadeiras ou promessas de futuro — apenas caixas para carregar, gritos de chefes bêbados e o som de ossos estalando quando algum adulto tentava se impor.
E sempre que alguém ousava enfrentá-lo... saía de lá diferente. Ou quebrado.
"True tem olhos que não combinam com sua idade." – diziam os veteranos do porto. Olhos fundos, que pareciam observar o mundo como se estivesse em constante julgamento.
Mas o que ninguém sabia era que, em 2021, um evento secreto estava prestes a se espalhar como uma epidemia silenciosa entre as sombras do mundo: o retorno de um torneio lendário, ilegal e brutal. Um campo de batalha onde a força não era apenas medida por socos, mas por ideologia, sofrimento e sobrevivência.
E nesse caos, um garoto sem nome, sem família e sem futuro...
estava prestes a deixar sua marca.
Seu nome era True Hagai. E ele nasceu para lutar.
A Vida de True no PortoO porto de Osaka nunca dorme. Caminhões vão e vêm, gruas movimentam contêineres como se fossem brinquedos, e os gritos dos encarregados cortam o ar como lâminas. É ali, em meio a homens crescidos, ex-presidiários e trabalhadores duros como pedra, que True Hagai sobrevive.
Ele chega antes do sol nascer, vestindo uma camiseta velha, sempre suja de graxa e suor, uma calça jeans rasgada nos joelhos e botas que já não seguram nem a água da chuva. Não reclama. Nunca reclamou. Seu corpo, mesmo jovem, é assustadoramente definido — ombros largos, costas marcadas por cicatrizes finas, braços secos e fortes como os cabos de aço que carrega. Seus músculos não são de academia. São de carga, de sobrevivência. De dor.
O rosto de True é fechado, com a pele morena marcada por sol e poeira. Cabelos negros e bagunçados, caindo sobre a testa. Os olhos, no entanto, são o que mais assusta: escuros, afiados e inexpressivos. Quem cruza o olhar com ele sente como se estivesse sendo medido por dentro.
Ele não fala muito. Os outros trabalhadores até tentaram zombar dele quando chegou ali, ainda com 11 anos, tentando carregar caixas que pesavam mais do que seu próprio corpo. Mas ninguém ri mais. Um deles tentou empurrá-lo uma vez… True quebrou dois dedos do sujeito com um golpe simples. E então voltou ao trabalho como se nada tivesse acontecido.
Mora num cubículo improvisado perto dos armazéns, onde usa uma esteira fina como cama. Treina sozinho à noite, socando pneus pendurados, fazendo flexões no concreto frio, mergulhando no mar escuro quando precisa limpar a mente. Seu corpo é seu único templo. Sua única arma.
A cidade gira em torno de tecnologia, mídia e agitação moderna, mas True vive como um fantasma do passado — como se não pertencesse a essa era. Ele não tem celular, não conhece redes sociais. Só sabe uma coisa: ser forte é a única forma de existir no mundo onde nasceu.
Ainda que não diga em voz alta, há uma tempestade dentro dele. Um vazio. Um nome que nunca ouviu: o de seu pai. E um impulso incontrolável que cresce a cada dia:
a vontade de lutar.
CAGE:2021 — Capítulo 1: Fantasmas de AçoO porto não era apenas um lugar de trabalho. Era um campo de batalha silencioso. Para True Hagai, aquele mundo de ferro, fumaça e mar havia se tornado tudo o que ele conhecia — e nele, apenas um homem conseguia falar com ele sem ser ignorado.
Seu nome era Boris Soure.
Um colosso vindo da Europa Oriental, com 1,92m de altura e mais de 120kg de músculo bruto e cicatrizes esquecidas. Antigo boxeador profissional, expulso por envolvimento com lutas clandestinas. A barba grisalha e os olhos fundos contavam histórias que ninguém ousava perguntar. A pele, pálida como cinza, parecia sempre coberta por uma fina camada de poeira industrial. Quando ele caminhava, o chão parecia escutar.
Boris era o homem que acolheu True quando a mãe do garoto morreu. Não por bondade. Mas por reconhecer algo nos olhos do menino que ele conhecia bem: a raiva contida, moldada pelo abandono.
True, aos 14 anos, já era um fenômeno físico. 1,67m de altura, 59kg de músculos densos, pesados e naturais. Ele nunca havia treinado em academias. Seu treinamento era o mundo real — empurrar barris, içar caixas, socar metal para não chorar. Seu corpo era pequeno comparado aos homens do porto, mas quando ele golpeava, soava como um tambor de guerra.
Naquela noite, depois do trabalho, Boris o esperava no canto escuro do galpão 3, onde os dois dividiam um pequeno espaço com um saco de areia improvisado e pneus empilhados.
Boris, acendendo um cigarro, observava o garoto em silêncio.
— "Você cresceu mais rápido do que devia." — disse, com a voz grave, quase arrastada.
True não respondeu. Estava ocupado fazendo flexões, os punhos rasgados tocando o chão duro.
— "Sabe o que dizem sobre garotos como você, moleque?"
— "Não me importo com o que dizem." — respondeu ele, sem parar.
Boris soltou uma risada seca.
— "Bom. Porque a maioria morre antes dos vinte."
True parou. Levantou-se. Suado, o corpo tremendo não de cansaço, mas de contenção.
— "Você acha que eu sou como os outros?"
— "Não." — Boris encarou o menino como se visse um espelho. — "Você é pior. E isso é bom."
Ele deu um passo à frente, jogou um velho tablet nas mãos de True. Na tela: uma transmissão em baixa qualidade de uma luta ilegal. Dois homens num ringue cercado por grades, como uma jaula. Um deles arrancava sangue do outro com os punhos nus, enquanto a multidão gritava como animais selvagens.
Acima, em letras vermelhas:
CAGE:2021 — A Jaula Se Abriu
— "Esse é o mundo real, garoto. Não o que tá lá fora com uniforme escolar e sorrisos falsos."
— "E onde fica isso?" — perguntou True, os olhos fixos na tela, faíscando.
— "Se você realmente quiser entrar… o caminho se abre sozinho. Mas uma vez lá dentro, não tem volta."
Boris virou-se, jogando o cigarro fora.
— "Você é mais forte do que imagina, True Hagai. Mas força sem propósito... é só destruição."
True fechou o punho. Pela primeira vez em muito tempo, sentia algo além da sobrevivência. Um chamado.
O Olho do CaçadorA névoa pairava espessa sobre o porto naquela manhã. O cheiro de sal misturado ao óleo era forte, como se o próprio mar estivesse suando. Entre caminhões e guindastes, um carro preto de luxo, com janelas escuras, avançava lentamente, destoando de tudo ao redor.
Dele saiu um homem com passos firmes e olhar penetrante.
Yuchagashi Rando.
1,85m, 93kg, terno impecável cinza-escuro sob um longo sobretudo preto. Os cabelos eram curtos, bem aparados, com alguns fios prateados indicando os anos de experiência — não idade, mas sobrevivência. Seus olhos, puxados e extremamente calmos, passavam por tudo ao redor como se estivesse enxergando além da matéria. A aura ao seu redor era tão precisa que até os trabalhadores mais agressivos deram um passo para o lado sem pensar.
Yuchagashi era o Diretor Executivo do Conselho de Seleção do Torneio CAGE — o homem responsável por encontrar guerreiros que não pertenciam à superfície da sociedade… mas às suas entranhas.
Ele havia escutado sussurros. Histórias abafadas por suor e medo. Um jovem do porto. Um garoto que parecia ter nascido apenas para o combate.
Boris estava sentado em uma pilha de tábuas, mastigando pão seco e tomando café ralo. Quando viu Yuchagashi se aproximar, não pareceu surpreso.
— "Você tá longe de Tóquio, caçador."
— "Estou onde a violência verdadeira respira." — Yuchagashi respondeu, com a voz calma, quase educada demais.
— **"E ouvi que você está escondendo um monstro."
Boris não respondeu. Apenas se levantou, deixando a caneca sobre a madeira.
— "Ele não é um monstro." — murmurou. — "É um garoto que esqueceu como ser humano."
**
Caminharam até um dos armazéns abandonados. O som de pancadas secas ecoava no ar metálico. Ao entrarem, Yuchagashi viu: True Hagai. Sozinho. Com os punhos sangrando, acertava um pilar de concreto como se estivesse tentando quebrar o mundo.
O chão ao redor estava rachado. Fragmentos de cimento caíam. Cada soco tinha intenção assassina. Mas não era raiva. Era... foco. Controle puro.
Yuchagashi observou em silêncio por longos segundos.
— "Quantos anos ele tem?"
— "Quatorze."
— "…Quatorze?" — pela primeira vez, um brilho raro de surpresa passou pelo rosto inexpressivo de Yuchagashi.
True parou, notando a presença.
— "Quem é ele?"
— "Alguém que caça animais como você." — Boris respondeu com uma risada seca.
Yuchagashi deu dois passos à frente. Olhou True nos olhos.
— "Hagai True. Seu nome circula entre as sombras, embora você nunca tenha saído daqui."
— "E o seu?"
— "Yuchagashi. E eu decido quem vive ou morre na jaula."
True não desviou o olhar.
— "Então me leve até ela."
Um sorriso discreto surgiu no canto da boca de Yuchagashi.
— "Ainda não." — ele tirou um pequeno tablet do bolso do casaco e mostrou um vídeo de um homem gigante quebrando o maxilar de outro com uma joelhada brutal. — "A CAGE não é lugar pra amadores. Nem pra prodígios. É pra aberrações."
Fechou o tablet.
— "Você terá sua chance. Amanhã. Aqui mesmo. Um oponente será enviado para testá-lo."
— "Se vencer, estará dentro."
True limpou o sangue das mãos na camisa, os olhos ainda fixos no estranho à sua frente.
— "E se eu matar ele?"
Yuchagashi voltou a sorrir, como se esperasse exatamente essa pergunta.
— "Então eu te dou um adversário ainda pior."
E com isso, virou-se e foi embora, como se tudo já estivesse decidido.
O Escolhido da NoiteOsaka – Japão
23:41 da noite
Temperatura: 12°C
Chuva leve. Vento frio vindo do leste.
No topo de um prédio abandonado no distrito industrial de Osaka, o som de socos ecoava como trovões abafados. A estrutura era antiga, com paredes rachadas, piso molhado pelas goteiras e cheiro de ferrugem no ar. Apenas a lua, escondida por nuvens escuras, iluminava aquele campo de batalha.
No centro de um salão destroçado, dois homens se enfrentavam com fúria e precisão.
Um deles, de jaqueta verde escura manchada de barro, era David Hoshima.
1,78m, 81kg, cabelos pretos raspados nas laterais, olhos verdes cortantes como navalhas. Seu nariz estava torto, já quebrado algumas vezes, e cicatrizes cobriam seus braços como medalhas. Usava calças largas e luvas de couro desgastadas. Seus músculos pareciam cabos de aço tensionados.
David estava com os braços erguidos em posição de guarda alta, respirando pesado.
— "Haa… haa… Mutesouri…"
Na frente dele, como uma estátua esculpida por pura violência, estava Mutesouri Kant.
1,91m, 94kg, corpo esguio mas definido, com músculos longos como os de um pantera. Seus cabelos brancos e longos caíam até os ombros, grudados pela umidade do ar. Seus olhos eram âmbar, quase felinos. Não vestia camisa — apenas calças negras e os pés descalços. Sua pele estava marcada por hematomas… mas ele sorria.
— "Você ainda está de pé. Isso é admirável." — disse Mutesouri, com a voz calma, quase serena.
David avançou com um golpe giratório de cotovelo, seguido por uma sequência de socos curtos, usando uma técnica derivada do Pankration, uma arte marcial ancestral.
Mas Mutesouri desviava com movimentos mínimos. Elegância e instinto.
Ele usava algo diferente… algo que lembrava o Shinshin Kaikan misturado com técnicas proibidas de combate prisional.
Então, o contra-ataque.
Um chute no baço. Um joelho no queixo. E, por fim, um movimento brusco — um golpe com as costas da mão que girou o corpo inteiro de David, fazendo-o cair de costas, desacordado, com a respiração presa no peito.
O silêncio reinou por dois segundos.
Até a porta enferrujada se abrir com um rangido firme e ecoante.
Yuchagashi entrou.
— "Lamentável…" — disse com frieza, encarando o corpo caído de David.
Mutesouri apenas virou o rosto em sua direção, ainda recuperando o fôlego.
— "Foi um bom adversário. Mas me subestimou."
Yuchagashi deu alguns passos, com as mãos atrás das costas.
Seu olhar passou por Mutesouri de cima a baixo, avaliando, calculando, como um cirurgião analisa uma lâmina afiada.
— "Mutesouri Kant. Filho de um assassino de guerra. Exilado aos 17. Internado aos 19. Escapou aos 24. Você se manteve escondido… até hoje."
Mutesouri limpou o sangue do lábio com o dorso da mão.
— "Você veio aqui só pra me julgar?"
— "Não." — Yuchagashi respondeu. — "Vim entregar um convite."
Ele tirou um pequeno papel dobrado do bolso do sobretudo.
— "Existe um jovem. Nome: True Hagai. Ele derrotou concreto com os punhos nus. Dizem que nasceu para lutar… mas eu preciso ter certeza."
— "Você quer que eu o enfrente?"
— "Não." — o olhar de Yuchagashi brilhou brevemente. — "Quero que você tente vencê-lo. A pré-luta está marcada. Você é meu trunfo. Vamos ver se esse garoto é mesmo uma aberração como dizem."
Mutesouri sorriu. Pela primeira vez naquela noite, não era um sorriso de desprezo ou soberba… mas de empolgação pura.
— "Se ele for forte o bastante… talvez consiga me quebrar."
— "Ou morrer tentando."
Yuchagashi virou-se e saiu.
O vento soprou mais forte.
A noite em Osaka ainda tinha ecos de violência no ar.
Memórias de Ferro e PelePorto de Osaka, três anos antes
Horário: 05h18 da manhã
Temperatura: 6°C
Neblina baixa cobrindo os trilhos do guindaste
O som do mar era abafado pela névoa densa, e o cheiro de peixe velho e diesel pairava no ar. Dentro de um pequeno cômodo improvisado entre contêineres, o frio cortava como faca. Lá dentro, uma mulher preparava um chá ralo em um fogão à gás. Seu corpo já dava sinais de fraqueza, mas seus olhos… ainda carregavam o fogo da luta diária.
Seu nome era Josefa Hagai.
Tinha 36 anos, era magra, com 1,62m de altura e cerca de 50kg. Sua pele era morena e seus cabelos, negros e amarrados em um coque improvisado, viviam cobertos por um lenço velho. Usava sempre o mesmo casaco de lã puído e calças largas de operária. Os dedos estavam sempre rachados e sujos de óleo. Ela limpava navios — sozinha — e ninguém a respeitava por isso.
Mas para True, ela era o mundo inteiro.
— "Acorda, meu filho. O dia começou."
A voz dela era suave, mas firme. True, deitado sobre uma esteira fina, abriu os olhos lentamente. Tinha 11 anos. O rosto ainda redondo, mas o corpo já mostrava músculos que não pertenciam a uma criança. Ele calçava as botas, sempre sem meias, e olhava para o chão como se odiasse o dia.
Josefa sentou-se ao lado dele, entregando a caneca de chá.
— "Você tem que prometer uma coisa pra mim, True."
— "O quê?"
— "Não seja só mais um desses homens que se tornam pedra. Promete pra mim que vai ser mais do que isso. Que vai ter propósito."
— "Eu não entendo." — ele disse, bebendo o chá amargo sem reclamar.
Ela sorriu.
— "Um dia vai."
Naquela manhã, enquanto ela partia para o cais com os joelhos doendo e a coluna arqueada, True observou pela pequena fresta da porta. Ela tossia sangue escondido. E mesmo assim… caminhava em frente.
Três meses depois, ela estava morta.
True não chorou no dia do enterro. Nem no dia seguinte. Apenas ficou sentado no mesmo lugar, olhando para as mãos. Mãos que não puderam segurar a vida de sua mãe. Mãos que se tornariam, dali em diante, sua única arma.
Naquela noite, ele foi até os contêineres, sozinho.
Começou a socar uma chapa de aço. Repetidas vezes.
Chorando em silêncio, até as juntas abrirem e o sangue escorrer.
E nesse momento… algo dentro dele nasceu.
Não era ódio.
Não era dor.
Era vontade.
A mesma que sua mãe carregava.
Mas diferente dela, ele não serviria.
Ele tomaria.
E agora, três anos depois, no mesmo porto onde Josefa morreu, True Hagai está prestes a enfrentar um adversário como nunca viu antes.
O nome dele é Mutesouri Kant.
E o teste final está chegando.
A Besta Contra o HomemPorto de Osaka
Galpão 3 – 22h47
Temperatura: 10°C. Céu limpo. Silêncio absoluto.
O chão do galpão estava limpo. Pela primeira vez. Os operários foram afastados. Correntes reforçadas travavam as portas. Luzes industriais lançavam sombras duras no concreto rachado. A luta não seria vista por muitos — apenas pelos que importavam.
No canto superior do armazém, em uma estrutura de ferro acima dos contêineres, Boris Soure observava com os braços cruzados. Ao seu lado, calado como uma lápide, Yuchagashi Rando mantinha os olhos fixos na arena improvisada.
No centro, dois homens estavam frente a frente.
Um garoto.
Um predador.
True Hagai, 14 anos, olhos vazios como um poço profundo.
Mutesouri Kant, 27 anos, cabelos brancos grudados na pele e um leve sorriso nos lábios.
— "Você é mais jovem do que eu imaginava." — disse Mutesouri, girando o pescoço lentamente. Estalos.
— "Você é mais falante do que eu gostaria." — respondeu True, sem emoção.
O ar entre eles parecia tremer. Não havia sinos. Não havia regras.
Boris murmurou:
— "Se ele sobreviver aos primeiros vinte segundos... então pode vencer."
Mutesouri foi o primeiro a avançar.
Um passo. Dois. Depois, um impulso explosivo — como um felino saltando. O chão afundou sob seus pés. Seu primeiro ataque foi um golpe de mão aberta, mirando diretamente o peito de True. Não um soco. Um corte.
Técnica: Garra Prisional – Corte do Dragão Estrangulado.
Uma técnica de combate usada por internos em prisões clandestinas — dedos rígidos, ponta dos ossos voltados como lâminas.
True cruzou os braços, bloqueando.
CRACK.
O impacto empurrou True dois metros para trás. Seus antebraços arderam. Sangue escorria lentamente.
— "Ele não hesita..." — pensou True. — "Esse homem luta como se cada golpe fosse pra matar."
Mutesouri não deu tempo. Girou o corpo em um chute lateral. True se abaixou. Contra-atacou com um soco direto no abdômen.
BOOM!
O golpe acertou.
Mutesouri cambaleou um passo para trás… e sorriu.
— "Você é bruto. Não técnico. Mas seu corpo tem uma fúria que grita."
True não respondeu. Avançou de novo, como um animal encurralado, desferindo uma sequência de socos — um gancho, um direto, um cruzado de esquerda.
Técnica: Corrente do Martelo – Estilo de Combate do Porto.
Movimentos duros, secos, sem floreios. Força concentrada nos ombros e quadris.
Mutesouri defendeu o primeiro. Esquivou do segundo. O terceiro o pegou de raspão no maxilar. Um corte abriu. Sangue escorreu pelo canto da boca. E então ele revidou com um chute giratório no tórax de True.
SMACK!
O garoto voou três metros. Caiu de costas. Tossiu. Cuspiu sangue.
Lá de cima, Boris deu um passo à frente, tenso.
Yuchagashi, sem desviar os olhos, falou baixo:
— "Ele ainda não está pronto."
Mas então, eles viram:
True se levantando. Sem pressa. Sem medo.
— "Você luta como se já estivesse morto." — disse True, limpando o sangue com as costas da mão.
— "E você... luta como alguém que ainda não entendeu o que está sentindo."
True avançou.
Dessa vez, não com velocidade, mas com intenção.
Mutesouri saltou para frente, tentando outro ataque com a técnica de pressão dos dedos — visando os olhos.
Mas True desviou por um milímetro.
E cravou um soco no queixo de Mutesouri com toda a força.
BAAAAM!
Mutesouri voou para o lado, caindo com o rosto no chão. Mas girou no próprio eixo e se levantou com um sorriso aberto.
O sangue agora escorria do nariz, dos lábios, da sobrancelha.
— "Ótimo. Ótimo. Esse é o olhar que eu esperava ver..."
— "Você não sabe nada sobre mim." — murmurou True.
— "Não. Mas sei o que é perder tudo… e continuar de pé mesmo assim. Porque quando não resta nada, restam os punhos."
Ambos correram um para o outro.
Impacto. Corpo contra corpo. Os músculos rugindo. O concreto rachando sob seus pés.
Fim da primeira metade.
Grito na JaulaPorto de Osaka
Galpão 3 – 22h56
Luzes piscando. Concreto manchado de sangue.
O silêncio que antecedia o caos foi rompido.
True Hagai e Mutesouri Kant colidiram novamente.
Desta vez, não havia mais estudo, cautela ou análise.
Era puro instinto. Pura vontade de dominação.
— "HAAAAAH!"
True desferiu um gancho de esquerda, mas Mutesouri bloqueou com o antebraço e girou em volta do garoto com um movimento circular de quadril.
Técnica: Vento Cortante – Redemoinho Exterior.
Uma técnica de evasão e controle de espaço, usada para quebrar o ritmo do inimigo.
Mutesouri acertou um chute giratório nas costelas de True, seguido de uma cotovelada vertical na base do pescoço.
CRACK.
True caiu de joelhos, cuspindo sangue espesso e escuro. Mas seus olhos estavam abertos, e seu punho… trincado, ainda cerrado.
— "Ele devia estar inconsciente." — murmurou Boris lá de cima.
Yuchagashi observava em silêncio. Suas pupilas pareciam focar em algo além da matéria. Ele via mais do que uma luta. Via vontade crua sendo testada até o limite.
— "Ele não vai vencer."
— "Mas vai sobreviver." — respondeu Boris, cruzando os braços. — "E isso já é mais do que o suficiente pra estar aqui."
De volta à arena, True se levantava.
Ele saltou para frente, abaixando o corpo, girando com os dois punhos fechados em um ataque lateral brutal.
Técnica: Corrente Dupla do Martelo
Golpe improvisado. Força concentrada no impacto lateral para quebrar defesas.
BAM – BAM!
O primeiro punho acertou o estômago de Mutesouri. O segundo, o queixo.
Mutesouri recuou dois passos, cambaleando.
— "Você…" — disse ele, rindo com sangue escorrendo dos dentes. — "Você está aprendendo a machucar."
Mas o olhar de True não refletia prazer. Era puro vazio.
Ele avançou mais uma vez, mas desta vez Mutesouri agiu com frieza absoluta.
Técnica: Quebra de Espírito – Reversão do Homem Morto.
Movimento usado para quebrar não só o corpo, mas o instinto de reação.
Ele fingiu cair, mas girou com o joelho e atingiu a lateral da cabeça de True com o calcanhar.
O som foi seco.
CRACK!
True caiu.
E não se levantou imediatamente.
Silêncio.
Mutesouri ofegava, suado, coberto de hematomas. Se ajoelhou ao lado do garoto e observou seus olhos meio abertos.
— "Você ainda me odeia?"
True respirava com dificuldade. Sorriso leve.
— "Eu não te odeio…"
— "Eu só… queria… continuar lutando."
Lá de cima, Boris e Yuchagashi desceram lentamente.
O eco de seus passos preencheu o galpão como tambores de funeral.
Mutesouri se afastou, limpando o rosto.
Yuchagashi encarou o corpo do garoto caído e ajoelhado.
True tremia. Tentava se levantar. E conseguiu — por um instante. Depois caiu de novo.
Yuchagashi então falou:
— "Teste encerrado."
Boris não disse nada. Apenas passou os olhos pelo garoto como se olhasse para a versão mais jovem de si mesmo.
Yuchagashi então se abaixou e falou perto do ouvido de True, com a frieza de um juiz e o tom de um arauto:
— "Você perdeu."
— "Mas… passou."
True não reagiu. Estava entre a dor e o desmaio.
— "Amanhã, voltarei com as regras."
— "A CAGE agora reconhece seu nome."
Yuchagashi se levantou.
Virou-se para Mutesouri, que limpava o sangue com a mão aberta.
— "Prepare-se. O torneio está perto."
O galpão ficou vazio.
A única coisa que restava… era o som do coração de True batendo devagar.
Aos poucos.
Mas ainda batendo.
Fim do Capítulo