Ficool

Chapter 30 - Capítulo 30 – Viver da Montanha

Assim que pensou nisso, Chen Shi saltou de pé e pulou em direção ao mundo de onde vinha a luz do sol.

"Bang!"

Ele atravessou a luz solar — e a projeção do outro mundo — apenas para bater de cabeça no teto do templo.

Caindo no chão, Chen Shi esfregou a cabeça dolorida e olhou para cima.

A luz vinha de outro mundo, e ele teve a sensação de que, se seguisse aquele raio, poderia realmente entrar naquele lugar distante.

Saltou novamente, desta vez estendendo a mão com cuidado. Seus dedos passaram pela luz, mas ela era ilusória — visível, porém intocável, como um sonho ou uma miragem.

"Parece que o tempo e o espaço dentro do templo não pertencem realmente a outro mundo. Deve haver algum tipo de poder misterioso aqui, que me permite ver aquele outro lado — e faz com que o sol e a lua daquele mundo iluminem este lugar."

Desde que começara o processo de troca de sangue verdadeiro, seu apetite aumentara enormemente.

Não importava se fosse a comida medicinal preparada pelo avô ou as refeições da vovó Sha — ele devorava tudo, e logo depois voltava a sentir fome.

A fome vinha tão rápido que, em apenas dois dias, perdera quase três quilos.

Com apenas trinta quilos de peso, aquilo o fazia parecer ainda mais magro e frágil.

Chen Shi sabia que havia chegado a um ponto crítico.

A primeira etapa para formar o Corpo Sagrado era a troca de sangue verdadeiro.

Quando o ser humano ainda é um bebê, o sangue que corre em seu corpo é puro e natural — o chamado sangue verdadeiro.

O bebê não respira pela boca ou pelo nariz, mas através do cordão umbilical, que liga sua respiração à da mãe. O ar que chega ao bebê vem purificado pelo corpo materno, sem impurezas.

Esse ar é o que chamam de qi inato.

Mas, após o nascimento, o bebê começa a respirar o ar do mundo — cheio de poeira e impurezas — e isso se torna o qi adquirido.

A partir daí, o corpo humano começa a ficar pesado e impuro, e o qi inato diminui cada vez mais.

Quando, na velhice, esse qi inato se esgota por completo — a vida termina.

Os cultivadores de artes demoníacas, temendo a morte, às vezes trocam o próprio sangue por sangue de jovens, na tentativa de absorver o qi inato deles e prolongar a juventude.

Os mais cruéis chegam a refinar o chamado Ziheche — extraindo o sangue de fetos ainda não nascidos, para reabastecer o próprio corpo com essa energia vital.

No caso de Chen Shi, sua fome extrema era uma forma de suplementação. Ele precisava absorver a essência dos alimentos — a energia pura contida neles — para criar seu sangue verdadeiro.

Mas os alimentos comuns continham apenas a energia das cinco sementes — uma energia fraca e limitada.

Somente as refeições medicinais do avô, ricas em força espiritual, conseguiam sustentá-lo por mais tempo.

Ainda assim, ele cultivava tão rápido que nem mesmo a comida mais nutritiva conseguia acompanhar o ritmo.

Seu corpo começou a consumir a própria carne e órgãos para continuar refinando o sangue.

Se não comesse o suficiente... acabaria morrendo de fome!

Quanto mais rápido cultivasse, mais rápido morreria!

Por isso, teve de reduzir o ritmo.

Agora, passava quase todo o dia procurando comida.

Os patos da vovó Yu Zhu já mal conseguiam botar ovos; os melões do campo da velha Wu Zhu quase haviam desaparecido; e os peixes do rio Yudai estavam pela metade.

Às vezes, ele até corria até a vila de Gangzi na hora do almoço — o que fazia a vovó Sha suspirar de desespero toda vez que o via chegar.

Certa vez, pensou até em usar a si mesmo como isca para pescar um Grande Kun — só para ver o sabor.

Ele estava faminto demais.

Naquele dia, ao praticar no Templo do Senhor da Montanha, a fome veio novamente em questão de minutos.

Permaneceu mais um pouco, mas o desconforto só aumentava — o estômago doía, a cabeça girava.

Saiu apressado, tentando achar algo na floresta: frutas, caças, qualquer coisa.

Mas aquela montanha havia surgido recentemente — além da grande árvore do templo, não havia outras plantas, e nem os animais ousavam se aproximar.

Seguindo pela trilha, passou pelo bosque onde viviam os pequenos espíritos gordinhos.

Tonto e cambaleante, deu mais alguns passos... e desabou no chão com um "thud!".

Mesmo confuso, ainda viu o céu azul e as nuvens.

Percebeu que estava sendo movido — folhas e flores passavam acima dele — e então desmaiou de novo.

Ninguém sabe quanto tempo se passou.

Quando abriu os olhos novamente, viu um rosto belo e familiar — o da jovem do riacho. Mas logo a imagem se desfez, transformando-se no rosto enrugado da avó Zhuang.

"Ele acordou! Acordou!"

A voz da avó ecoou. Chen Shi percebeu que a fome havia diminuído um pouco e que sua visão voltava ao foco. Estava deitado dentro do oco da grande árvore, onde cogumelos brilhavam com luz azulada.

A jovem do riacho estava sentada ao lado, calma e graciosa.

Os pequenos espíritos — os gordinhos — o cercavam, olhando-o com olhos redondos e curiosos.

A avó Zhuang segurava um deles pelo cabelo e, com cuidado, colhia algumas frutinhas vermelhas que cresciam em sua cabeça — do tamanho de uma avelã. O pequeno gritava e chorava, mas ela ria.

Chen Shi olhou em volta e percebeu que os outros também tinham menos frutinhas na cabeça — provavelmente já haviam sido colhidas.

A avó Zhuang sorriu:

"Você desmaiou de fome. Foram os pequenos Frutinhas que te trouxeram até aqui.

A moça do riacho fez uma sopa de peixe pra você, mas não adiantou muito — sua fome era grande demais.

Então usei algumas frutas de raiz de ginseng para te salvar."

Chen Shi se levantou, sentindo-se completamente saciado, e agradeceu sinceramente.

A jovem do riacho corou, soltou um risinho e saiu flutuando.

Os pequenos Frutinhas vieram até ele, alguns subindo em seu colo, e começaram a balbuciar com expressões sérias — pareciam estar o advertindo para comer direito. Depois disso, foram embora também.

Chen Shi agradeceu novamente e tentou sair, mas tropeçou logo no primeiro passo.

A avó Zhuang sorriu:

"O poder medicinal das frutas de ginseng ainda está se espalhando pelo seu corpo.

Descanse um pouco antes de ir."

Ele assentiu e sentou-se novamente.

Curiosamente, embora tivesse comido apenas algumas frutas, sentia-se completamente satisfeito.

Logo uma onda de calor percorreu seu corpo — uma sensação reconfortante e indescritível.

"Avó Zhuang, o que são essas frutas de ginseng?" — perguntou ele.

Ela, pouco acostumada a conversar, pensou um pouco e respondeu:

"São os frutos que crescem na cabeça dos pequenos Frutinhas."

Chen Shi arregalou os olhos:

"Então... o que exatamente são eles?"

"São raízes de ginseng com milhares de anos." — explicou ela. — "As frutas que crescem neles podem salvar vidas. Você estava com fome demais, então te dei algumas a mais."

Chen Shi ficou boquiaberto. Aqueles pequenos espíritos... tinham milhares de anos?!

Nem pareciam.

"Avó Zhuang, a senhora conhece o Templo do Senhor da Montanha?" — perguntou ele.

"Claro. É aquele lugar que você tem visitado ultimamente.

Há pouco tempo, o templo e a montanha surgiram do subsolo de uma vez só — cresceram durante a noite! Mais rápido do que eu, veja só."

Ela suspirou, meio invejosa.

Chen Shi se animou:

"Se o templo emergiu do chão, então ele deve ter existido antes, apenas estava enterrado!

A senhora se lembra de como era antes disso?"

A avó Zhuang pensou um pouco e balançou a cabeça.

"Não. Desde que tenho memória, sempre foi um terreno plano. A montanha só apareceu recentemente."

Chen Shi ficou espantado. A avó Zhuang era a maior árvore que já vira — devia ter milhares de anos.

E aquilo nem era o corpo original dela!

Ela era apenas um novo broto que cresceu após a árvore-mãe morrer.

Então, se o templo já existia antes mesmo da árvore-mãe, isso significava que havia sido enterrado há mais de seis mil anos!

"Meu corpo original foi destruído há cerca de seis mil anos," disse ela, pensativa.

"Foi mais ou menos nessa época que esta nova forma cresceu."

Chen Shi perguntou com curiosidade:

"A senhora se lembra de algo do tempo antes de sua destruição?"

A avó Zhuang franziu o rosto, esforçando-se para lembrar.

De repente, seus olhos se arregalaram e o corpo começou a tremer de medo.

"Fogo! Muita luz e trovões! Cortaram meu corpo! Está vindo!"

Ela se encolheu num canto, como uma criança assustada.

Chen Shi se apressou em consolá-la.

'Se até ela sente tanto medo, então o que aconteceu há seis mil anos deve ter sido algo terrível... Será que tem relação com o templo afundado?'

Mas logo balançou a cabeça.

'Sou só uma criança. Por que me preocupar com os problemas dos adultos?'

Mesmo as frutas de ginseng, tão poderosas, só o sustentaram por meio dia. Logo a fome voltou.

'As frutas são mais fortes que os remédios do vovô... mas ainda assim não bastam.'

Dois dias depois, a família Chen estava à beira da miséria.

A vila de Huangpo também.

Até a vovó Sha, da vila de Gangzi, já não sabia o que fazer — Chen Shi comia tudo o que via.

O olhar que ela antes tinha de ternura agora era de puro desespero, como se visse um pequeno demônio cobrador de dívidas.

'Se eu continuar assim, todos vão morrer de fome junto comigo.'

Refletindo, Chen Shi decidiu que não podia mais viver às custas dos outros.

"Viver da montanha" — era hora de caçar por conta própria.

No alto de Qianyang, a grande serpente Xuan Shan observava de longe.

Após uma chuva, o céu se abria, revelando um dia claro e brilhante.

De repente, o chão da montanha tremeu. Um rugido ecoou — e uma besta gigantesca surgiu da floresta.

Era um Fengxi.

Um javali selvagem que vive por cinquenta anos e atinge quase quatrocentos quilos é chamado xi — uma besta espiritual.

Mas quando sobrevive mais de cem anos, torna-se um Fengxi:

a cabeça enorme, ocupando dois terços do corpo, presas do tamanho de braços humanos, pelos como espinhos de aço, e força capaz de esmagar pedras.

Este não era o maior dos Fengxi, mas ainda assim media quase três metros de altura.

E à sua frente estava uma figura pequena, segurando as duas presas da criatura — lutando contra ela com pura força bruta.

Era Chen Shi.

Mesmo magro como um esqueleto, sua força era monstruosa.

O Fengxi o empurrava montanha abaixo, mas não por falta de poder — o chão cedia sob seus pés, e ele era arrastado para trás.

"Em força bruta... você não me vence!"

Com um grito, Chen Shi ativou todo o corpo — os músculos estalaram, as veias saltaram — e ele torceu as presas da fera, girando o corpo e arremessando o Fengxi contra o chão com um estrondo.

A criatura tentou se levantar, mas ele já estava sobre ela.

Com alguns golpes precisos, esmagou o crânio da besta espiritual.

O Fengxi se contorceu e morreu.

Sem perder tempo, Chen Shi o jogou sobre os ombros e correu para um riacho próximo — temendo que, se demorasse, a fome o matasse antes de terminar a refeição.

A serpente Xuan Shan o observava à distância, silenciosa.

Não interveio — afinal, era a lei da natureza.

À beira da água, Chen Shi limpou e esfolou o corpo do Fengxi, separando as partes com habilidade: costelas, rins, vísceras, orelhas, carne da cabeça, patas dianteiras e traseiras.

Cortou algumas árvores e preparou fogueiras.

As partes boas para assar, ele assou; as boas para ferver, jogou na grande panela que havia trazido da casa do avô.

A gordura do Fengxi pingava sobre o fogo, soltando um aroma dourado.

Chen Shi espalhou sal grosso e pincelou óleo sobre as costelas.

A serpente Xuan Shan observava de longe, pensando:

"Ele sabe comer melhor do que eu sabia em meus tempos antigos."

Logo a primeira travessa de costelas estava pronta.

Apesar do cheiro forte de carne espiritual, Chen Shi comia com gosto — seus dentes já eram duros como ferro.

A parte crocante e dourada estava perfeita: o estalo da gordura e o sabor rico faziam sua boca salivar, o suco quente estourando sob a língua. Cada mordida era puro deleite.

A carne espiritual liberava energia conforme era digerida, e o qi dela fluía diretamente para os órgãos de Chen Shi, nutrindo-os. A fome desapareceu quase por completo.

Observando de longe, a serpente Xuan Shan — que há três mil anos vivia apenas de vento e orvalho — de repente sentiu... fome.

Um tempo depois, viu Chen Shi se aproximando com uma das pernas traseiras do Fengxi.

A carne estava dourada e suculenta; ele havia feito cortes profundos na perna, esfregado sal grosso e recheado com ervas aromáticas antes de assar.

O aroma espalhou-se pela montanha.

Mesmo a velha serpente, há milênios sem provar carne, sentiu vontade de provar um pedaço.

More Chapters