A estrada era longa, repleta de inúmeras curvas e subidas íngremes. O terreno além do caminho principal era acidentado e íngreme; construir uma estrada como aquela deve ter exigido imenso tempo e recursos.
Minhas lembranças deste lugar não são muito vívidas, pensou Feng Qi. Eu só passei por aqui uma vez com minha mãe. Estávamos trancadas dentro de uma carruagem que mais parecia uma gaiola.
Naquele momento, o medo de Feng Qi era avassalador — tristeza, desespero, tudo o consumia. Ele tinha apenas doze anos e acabara de perder seu amado pai e sua irmãzinha.
"Tudo aconteceu muito rápido…"
Toda a riqueza que seu pai deixara foi confiscada sem hesitação. Logo depois, mãe e filho foram obrigados a viver na propriedade de Feng Zongyuan. Enquanto sua mãe servia a senhora da casa, Feng Qi começou a trabalhar na fazenda ainda muito jovem.
Ao ver sua mãe se esforçar para sustentar a ambos, Feng Qi começou a trabalhar como operário braçal na aldeia aos treze anos. Essa vida continuou até algumas semanas atrás, logo depois de completar dezessete anos.
"Parece um presente de aniversário dos céus." Um sorriso radiante se espalhou pelo seu rosto.
Originalmente, ele planejava permanecer na vila até atingir um nível de força comparável ao atual — a Quarta Camada de Refinamento Corporal — antes de seguir seu próprio caminho. Contudo, tudo aconteceu tão rápido que ele ainda custava a acreditar que estava ali. Em apenas duas semanas, ele havia suportado inúmeras dificuldades, enfrentado bestas demoníacas e quase morrido mais de uma vez.
"Este é o destino… a vida com que sempre sonhei", murmurou para si mesmo.
"Destino? Não entendi bem", perguntou o velho, curioso com os sorrisos frequentes do jovem conhecido como Zhao Long.
"Ah… como posso dizer…"
Ao perceber que havia falado em voz alta, Feng Qi não se conteve e respondeu honestamente.
"Acredito que todos têm um destino. É difícil saber exatamente qual é, mas você pode senti-lo com o coração."
"É possível compreender algo assim através do coração?"
"Não tenho certeza… mas quando alguém se sente tão livre, tão feliz, tão calmo — mesmo quando o caminho à frente está cheio de desafios — então esse caminho é verdadeiramente o seu destino."
"Bem… isso faz sentido. Você tem uma percepção aguçada, rapaz."
"Obrigado."
"Acredito que também vivi meu próprio destino", continuou o velho. "Quando nasci, meus pais não tinham nada — nada além de perseverança, coragem e necessidade. Nossa casa tinha apenas um colchão velho."
Feng Qi ouviu atentamente as palavras, carregado de experiência.
"Não havia cobertores, nem travesseiros — apenas alguns potes de barro. Mas a persistência do meu pai garantiu que a família tivesse o que comer. Apesar da nossa pobreza, eu nunca passei fome."
Feng Qi olhou para ele com os olhos de uma criança curiosa, como um neto ouvindo as antigas histórias de seu avô.
"Meu pai era trabalhador… gentil, um bom marido, um bom pai. Às vezes ouço crianças reclamando dos pais porque eles não têm dinheiro para comprar comida sofisticada, alegando que estão passando fome. Elas não sabem o que é fome de verdade. Quem nasce pobre enfrenta dificuldades, sim, mas com coragem, a fome não precisa definir suas vidas."
"Passei fome ", disse Feng Qi em voz baixa. "Passei fome de verdade. Houve épocas em que precisei sair só para encontrar algo para comer. Depois que meus pais morreram, fiquei sem ninguém. As únicas pessoas ao meu redor eram tão pobres quanto eu — se eu tirasse algo delas, elas é que passariam fome."
O velho olhou para ele em silêncio, com tristeza nos olhos.
"Só quem passou fome de verdade entende o que isso significa", disse Yang Chen suavemente. "Eu também já fui criança — teimoso e tolo. Mesmo agora, sinto dor ao me lembrar das palavras que disse ao meu pai. Você sabe o que ele me disse?"
Feng Qi permaneceu em silêncio.
Ele disse: " Fiz o meu melhor. "
Feng Qi lembrou-se subitamente do próprio pai — da sua bondade, integridade e amor. Uma lágrima escorreu-lhe pela face. Virou-se, contemplando a paisagem.
Yang Chen compreendeu e permaneceu em silêncio por um longo tempo.
O ódio ardia dentro de Feng Qi — ódio pelo Clã Feng — mas a tristeza pela família perdida era igualmente profunda. Ao longo da estrada, seus pensamentos vagavam sem parar. Às vezes, ele se imaginava tornando-se um deus, revivendo sua família. Parecia uma tolice... mas talvez não fosse impossível.
Após um dia inteiro de viagem, estruturas imponentes surgiram ao longe. À medida que se aproximavam, casas e torres tomavam forma. Era a cidade de Qingyao. Do alto da colina ao longo da estrada, a cidade se estendia diante deles, cercada por montanhas infinitas no horizonte.
"Finalmente…"
O coração de Feng Qi palpitava. Ele nascera ali, crescera ali até os doze anos. Os parentes de sua mãe — tios e primos — ainda moravam ali. Seus avós maternos já haviam falecido há muito tempo. Mesmo assim, Feng Qi não tinha intenção de visitá-los — não por ressentimento, mas para a segurança deles. Eram pessoas comuns, sem talento para o cultivo ou para governar. A maioria vivia como servos; alguns administravam pequenos negócios.
Feng Qi olhou para a cidade com os olhos semicerrados. Sua expressão não era agradável. Ele não tinha nenhum desejo de ficar preso a este lugar — lembrava-lhe demais de sua família, de uma época em que a vida ainda era calorosa.
Em seu coração, ele calculou seus próximos passos: primeiro, obter técnicas marciais avançadas; segundo, garantir recursos para o cultivo; terceiro, ingressar em uma seita para aprender sobre o mundo, a vida, as leis e o cultivo. Ao atingir o Refinamento de Qi, ele buscaria conhecimento e poder por todo o mundo. Nem mesmo o Império Chenyang o limitaria. Ele não pertenceria a nenhuma seita ou força em particular.
Seu espírito seria livre. Sua fortuna seria conquistada através do sacrifício.
De repente, os olhos de Feng Qi escureceram — não com intenção assassina, nem ambição de governar — mas com a intenção de transcender.
Ser livre.
"São olhos poderosos", disse Yang Chen calmamente.
Ele olhou para o jovem ao seu lado como se estivesse contemplando o próprio mundo.
"Acredito que seu destino… é viver."
Dentro da cidade, cultivadores estavam por toda parte. Alguns até voavam pelos céus, usando artefatos ou simplesmente cultivando. Torres, pavilhões e templos de clãs poderosos se erguiam imponentes. Ruas largas e limpas fervilhavam de tráfego.
Carruagens carregadas de bens espirituais passavam com frequência, cada uma guardada por guerreiros prontos para matar qualquer um que ousasse se aproximar. Outras carruagens transportavam cultivadores incapazes de voar — muitas pertencentes a figuras ricas e influentes, feitas de jade ou folheadas a ouro. O status de uma pessoa era claramente refletido em sua carruagem.
Contrariando as expectativas, a cidade estava repleta de árvores e jardins — alguns nutridos por Qi, outros meramente decorativos. Nos Jardins Espirituais, inúmeras ervas e flores emanavam auras visíveis. A Raiz Espiritual da Pureza Vital e a Flor de Sangue Espiritual que Feng Qi havia obtido seriam tesouros inestimáveis ali.
Um riacho atravessava Qingyao de ponta a ponta, como se a própria cidade tivesse sido construída ao seu redor. Alguns clãs poderosos até possuíam lagos espirituais em seus pátios, repletos de Energia Espiritual.
O céu estava repleto de cultivadores montados em espadas voadoras, carruagens espirituais, bestas aladas e muito mais. Alguns raros voavam sem qualquer auxílio — claramente elites da Formação Central.
O próprio ar vibrava com Qi.
Em certos palácios e templos, pairavam nuvens estranhas — Nuvens de Qi, pertencentes apenas aos clãs mais poderosos da cidade.
Ao chegar ao distrito comercial, Feng Qi viu de tudo, desde ervas espirituais e artefatos místicos até bestas aladas com preços inimagináveis. As transações eram realizadas em Qi Espiritual.
"Tão caro..." murmurou Feng Qi.
"Você conhece o valor do Qi Espiritual?", perguntou Yang Chen.
"N-não, mas posso dizer que é incrivelmente precioso. Refiná-lo é um processo longo e difícil."
"Muito bem dito. Isto é Qingyao — sejam bem-vindos."
"Obrigado, Yang Chen. Agradeço imensamente tudo o que você fez. Se o destino permitir, retribuirei dez vezes mais."
"Não diga isso. Ajudar os outros é nosso dever para com a sociedade. Sem essas pessoas, muitas profissões e recursos não existiriam."
"Eu entendo."
"Venha me visitar quando quiser. Você pode comprar muitas coisas aqui — e ganhar bastante também. Tudo depende do que você tem a oferecer."
"Se algum dia precisar da minha ajuda, terei todo o prazer em retribuir o favor."
Yang Chen pareceu surpreso, depois riu. "Muito bem... quando você se tornar algo próximo a um deus, conceda-me um desejo."
"Huh?"
O velho riu como uma criança e seguiu seu caminho.
Assim, Feng Qi finalmente chegou à famosa Qingyao.
Enquanto vagava pelas ruas, percebeu o quanto a cidade havia mudado — estava mais rica, mais vibrante. Cultivadores enchiam as ruas, desde iniciantes até especialistas poderosos. Alguns ele nem conseguia perceber.
"Devem ser pelo menos Condensação de Qi… talvez até Formação do Núcleo. Preciso ter cuidado."
Guardas da cidade patrulhavam constantemente — alguns com bestas espirituais, outros claramente especialistas em Condensação de Qi.
Até mesmo um simples guarda era muito mais forte do que ele.
Contudo, Feng Qi não se sentiu desanimado. Ele aguardava uma oportunidade para entrar em uma seita. Precisava provar seu valor.
Perto do centro da cidade ficavam vastas arenas, palco de torneios, duelos, batalhas de feras e competições de alquimia. Tabernas, pousadas e lojas especializadas alinhavam-se pelas ruas.
Um dos pátios atraiu uma multidão enorme.
Feng Qi parou.
Os combatentes eram cultivadores de Refinamento de Qi.
Um deles era um homem de aparência selvagem, empunhando duas adagas gêmeas — artefatos de Grau Refinado capazes de rachar pedra. Em frente a ele estava uma bela jovem.
Fez-se silêncio.
Ela avançou com leveza, a saia de seda azul esvoaçando, sua espada brilhando com um Qi pálido. O louco golpeou descontroladamente, rastros de Qi caóticos e violentos.
Ela desviou-se graciosamente, contra-atacou com fluidez — Qi cortando o ar.
As folhas dançavam. O vento agitava suas vestes.
Não foi apenas uma batalha.
Era uma dança.
Os olhos de Feng Qi se arregalaram.
Lindo.
A mulher venceu sem esforço.
A multidão irrompeu em admiração.
E o coração de Feng Qi ardia de saudade.
Este era o caminho que ele desejava trilhar.
