Enquanto o mundo bruxo estava inquieto com o que estava por vir, Renoir, de quem todos falavam, estava completamente nervoso e frustrado.
"Ele realmente se selou dentro da pintura. Que lunático." Reclamou Renoir. "Foram sete anos. Sete anos para conseguir escapar."
O atual Renoir era, na verdade, um reencarnado. Seu nome verdadeiro havia se perdido no momento em que assumiu aquele corpo.
Na vida anterior, ele era apenas um trabalhador comum que gostava de jogar nas horas vagas. Quando morreu, acordou no corpo envelhecido de Renoir Lucien Dessendre, o antagonista final do jogo Clair Obscur: Expedição 33.
No começo, achou que tinha reencarnado dentro do próprio jogo, afinal, o lugar em que estava era Lumière, a cidade inicial.
Mas quando as memórias do verdadeiro Renoir foram completamente assimiladas, ele percebeu a verdade, não estava no mundo do jogo, e sim no universo de Harry Potter, preso dentro da última obra-prima do verdadeiro Renoir, a Tela.
Graças à dilatação temporal dentro da Tela, o antigo Renoir viveu uma vida longa e plena. Mesmo com a doença de sua amada Aline, os dois viveram séculos felizes dentro da pintura.
Juntos, Renoir e Aline criaram um mundo inteiro dentro da Tela, criaturas, pessoas, cidades, animais e até o próprio céu. Eram verdadeiros deuses.
O atual Renoir achava isso fascinante, afinal, no jogo Expedição 33, quem havia criado a Tela foram Verso e sua irmã Clear, não Renoir e Aline.
Quando o fim dela chegou, Renoir, tomado pela tristeza, deixou a Tela por um breve tempo, apenas para cumprir a promessa feita a Aline, passar sua arte adiante.
Ele criou a Pintura Cromática como seu legado e pediu que o Ministério da Magia a entregasse a Hogwarts após estudá-la por um tempo. Com a promessa cumprida, retornou à Tela, decidido a viver o resto de sua vida ali.
Séculos se passaram até que o verdadeiro Renoir morreu de velhice, aos 632 anos.
E então um novo Renoir surgiu. O mesmo corpo, mas com uma alma diferente.
Com a chegada da nova alma, o corpo envelhecido de Renoir foi rejuvenescido até o exato momento em que ele havia entrado na pintura.
Infelizmente, antes de morrer, o verdadeiro Renoir usou todo o seu poder mágico e Chroma para selar a entrada da Tela, temendo que bruxos desconhecidos invadissem o mundo que ele e Aline criaram.
"Cara maluco..." Resmungou Renoir novamente.
Foram necessários anos para conseguir romper o selo e escapar da Tela.
Mas Renoir não estava realmente irritado. Ele havia herdado todas as memórias, conhecimentos e poderes do antigo Renoir e também algo muito mais poderoso.
[Missão Concluída: Escapar da Pintura.]
[Recompensa: Seu Chroma aumentou.]
Renoir havia despertado o Sistema Expedicionário.
Sua primeira missão foi escapar da pintura que o verdadeiro Renoir havia selado.
A recompensa não o impressionou, ele já possuía uma quantidade absurda de Chroma, mas como escapar era sua intenção desde o início, aceitou a missão com prazer.
"Ninguém em sã consciência recusaria um sistema." disse Renoir, rindo sozinho.
Olhando ao redor, percebeu que estava em um ateliê cheio de quadros em branco. De acordo com suas memórias, aquele lugar ficava dentro de sua mansão, em Lumière, na França.
E bem à sua frente estava o grande quadro, a Tela.
Um mundo inteiro criado por Renoir e Aline, agora completamente destruído.
A moldura estava quebrada, a tela rasgada, e as cores que antes representavam um universo inteiro agora estavam apagadas e cinzentas.
Ver tal cena causou uma estranha dor em seu peito.
"Foi mal destruir sua obra-prima..." murmurou. "Eu precisava sair. Prometo que vou restaurá-la algum dia."
Ele sabia que, mesmo danificada, enquanto o Chroma e a alma dos pintores estivessem intactos, era possível restaurar completamente a Tela.
"Dividir e colocar sua alma na pintura... isso é quase como fazer uma horcrux, mas sem matar ninguém, é claro."
Renoir se abaixou entre os destroços e pegou o maior pedaço da moldura quebrada.
Com um leve toque, ele canalizou o Chroma, deixando que a energia se espalhasse pela madeira.
As partículas de tinta que flutuavam no ar começaram a se mover, atraídas por ele.
O Chroma da antiga tela, junto dos fragmentos das almas de Aline e do verdadeiro Renoir, foi reunido naquele pedaço de moldura.
Quando terminou, Renoir levantou a mão e chamou o inventário do sistema.
Uma pequena tela em branco surgiu flutuando diante dele.
Sem hesitar, ele colocou o fragmento de moldura dentro dela, e o objeto desapareceu assim que tocou a superfície da tela.
[Item armazenado com sucesso.]
[Objeto: Fragmento de Moldura]
[Conteúdo: Vestígios de Chroma e traços de alma detectados]
Renoir observou a notificação desaparecer e soltou um suspiro curto.
Ele não conseguiria consertar a Tela ainda, mesmo tendo herdado os poderes e o conhecimento, ainda estava longe do Renoir original.
Na Tela, Renoir em seu auge era como um deus. Sua vontade se tornava realidade, e suas palavras moldaram o mundo.
Mas o novo Renoir carecia de algo essencial, a alma de um artista.
O Chroma é a energia vital e emocional que existe em todos os seres vivos e objetos com alma. Ele representa a cor da alma, manifestando-se através das emoções, da arte e da vontade de criar.
Enquanto a magia comum depende de feitiços e varinhas, o Chroma nasce diretamente do coração e da imaginação do usuário.
Renoir, no entanto, não possuía sensibilidade artística. Em sua vida anterior, foi apenas um homem comum, sem talento para nenhuma forma de arte.
Mesmo com séculos de lembranças e habilidades, ele não podia copiar as emoções que deram forma ao verdadeiro poder do Renoir original.
"Mesmo assim... ainda sou um dos bruxos mais poderosos!" Disse, tentando se convencer.
Reencarnado no mundo de Harry Potter, o mais importante era ser forte o suficiente para sobreviver.
Havia Voldemort, Comensais da Morte, bruxos das trevas e criaturas mágicas...
Mas nada disso o preocupava. Renoir havia começado já no nível máximo. Com exceção de Dumbledore, ninguém seria capaz de ameaçá-lo.
Deixando o ateliê, Renoir caminhou pelos corredores da mansão.
Pinturas de Aline, retratos de paisagens, lugares distantes e Gestrais preenchiam as paredes, os quadros não mágicos, mas cheios de sentimento.
"Esse lugar está imundo." Comentou.
A família Dessendre nunca teve elfos domésticos.
Eles preferiam cuidar da casa sozinhos, como um modo de passarem mais tempo juntos.
Tum!
Renoir bateu a bengala no chão e lançou um feitiço não verbal de limpeza que cobriu toda a mansão.
Ele poderia ter usado Chroma, mas quis testar magia comum. Durante os séculos em que esteve na Tela, quase nunca precisou usar feitiços tradicionais.
As luzes da mansão começaram a se acender como se respondessem à presença do dono.
Os objetos encantados voltaram à vida.
Os lustres se iluminaram, as cortinas se abriram revelando a tempestade lá fora, e na lareira uma chama azulada se acendeu.
A chuva caía devagar sobre os vitrais coloridos.
As luzes amareladas das lustres projetavam sombras que se moviam junto ao som distante de uma melodia.
Renoir sentou-se em uma velha poltrona de veludo azul. Seu olhar se perdeu, fixo na chama da lareira.
"..." A mansão parecia trazer uma sensação sufocante. "Eu não sou o Renoir verdadeiro... então por que isso está me afetando?"
Como se o destino o ouvisse, o antigo toca-discos começou a girar sozinho.
A agulha desceu sobre o vinil e, lentamente, a melodia de "Lumière" começou a preencher o salão.
Renoir nem teve tempo de questionar por que a música tema de Expedição 33 existia ali, no mundo bruxo, antes que uma onda de melancolia e nostalgia o atingisse com força.
O tempo ao seu redor pareceu desacelerar. Sua mente se esvaziou.
Os primeiros versos ecoaram como um sussurro distante, misturando francês e sons etéreos, um sonho pintado em notas.
"Dim dam talé lam vacarme..."
Renoir fechou os olhos.
As notas se espalhavam como tinta em água, suaves e profundas.
Cada som trazia uma lembrança, o riso de Aline na varanda, o cheiro de óleo e pigmento no ateliê, o reflexo dourado do sol sobre uma tela inacabada.
Ele abriu os olhos lentamente.
As chamas das velas tremularam e, por um instante, o salão inteiro pareceu respirar junto com a música.
Mesmo com todo o controle, o Chroma dentro de Renoir começou a se manifestar como tinta densa e melancólica, pronta para pintar o mundo inteiro.
Os quadros nas paredes refletiam pequenas manchas de luz, e no retrato de Aline, o olhar pintado dela parecia ganhar vida.
A música continuou subindo, etérea, envolvendo-o por completo.
Renoir apoiou o cotovelo no braço da poltrona e o rosto na mão. Seus olhos úmidos capturaram a pintura de Aline sob o brilho das velas.
"Estou chorando?" Perguntou-se, incrédulo.
Quando a música chegou ao fim, o silêncio que restou não foi vazio.
Era denso, carregado como se o próprio ar tivesse sido pintado de nostalgia.
O disco parou, e o som suave do vinil arranhando girou sozinho.
Renoir continuava ali, imóvel, genuinamente abalado.
Pelo visto sua reencarnação não trouxe apenas os poderes e memórias do antigo Renoir...
Mas também toda a carga emocional que ele havia deixado para trás. Principalmente o amor e a dor ligados a Aline.
Então, com um som suave de tinta se espalhando, uma tela flutuante surgiu diante dele, pulsando em luz azulada.
[Missão Pessoal Recebida: Reencontre Aline Dessendre.]
[Recompensa: ???]
[Aceita?]
Renoir ficou em silêncio. Seus olhos refletiam a luz da tela, tremendo levemente.
Ele fechou os olhos, respirou fundo e sentiu algo diferente.
Não era apenas tristeza, era algo que o verdadeiro Renoir já havia perdido há muito tempo.
Esperança.
Por um instante, o Chroma ao seu redor reagiu novamente.
Renoir sentiu que, se aceitasse aquela missão, não haveria volta. Ele e o verdadeiro Renoir se fundiriam, corpo e alma, tornando-se uma única existência, um novo ser nascido de duas vidas.
Com um peso indescritível no peito, Renoir estendeu a mão para a tela.
Por um breve momento, hesitou.
Queria recusar. Queria fingir que não sentia nada.
Mas algo lá no fundo, uma voz suave, familiar, não o deixou.
"Renoir..."
A voz parecia vir da própria pintura de Aline, como um eco distante.
"..." Renoir sentiu uma tristeza vinda do fundo da alma.
Ele não aceitou. Mas também não rejeitou.
E, por um instante, o sistema pareceu compreendê-lo, dissolvendo-se em partículas de tinta, como se dissesse: 'Tudo bem. Ainda não.'
Renoir simplesmente não estava pronto.
Ele permaneceu em silêncio. O quadro de Aline parecia observá-lo com um sorriso compreensivo, como se entendesse sua decisão.
"Isso deve ser coisa da minha cabeça..." Murmurou, olhando para a pintura na parede. "Deveria..."
Quack! Quack! Quack!
O retrato de um pato de repente ganhou vida.
Quack! Quack! Quack!
Levou alguns segundos até Renoir lembrar que aquele pato, o Senhor Quackton, servia como campainha.
Foi ideia de Aline, Renoir o odiava aquele pato, mas adorava ver o sorriso dela sempre que alguém tocava a campainha.
"Ela achava hilário..." Murmurou, suavemente.
Então percebeu que tinha visita.
"Acabei de voltar e alguém já apareceu na minha porta."
Sua mansão possuía encantamentos poderosos, tanto com magia tradicional quanto com Chroma, tornando-a invisível para bruxos e trouxas, quase como o feitiço Fidelius.
Pouquíssimos sabiam sua localização, e menos ainda conseguiam ver a mansão.
Usando Chroma para sondar o visitante, Renoir suspirou.
"Entre." Disse, enviando sua voz até o portão, que se abriu sozinho.
Ele continuou sentado na poltrona, esperando.
Sons de passos ecoaram, e então um bruxo velho de túnica branca e azul entrou.
"Devo dizer que você não mudou nada. O tempo parece ter ignorado você por cinquenta anos."
"Ignorado?" Renoir bufou. "Ele tirou tudo de mim. E parece ter tirado muito de você, Alvo."
Sim, se aconchegando em outra poltrona próxima à lareira, estava ninguém menos que Alvo Dumbledore.
"O tempo é assim..." Disse Dumbledore, com voz calma. "Ele cobra o preço, e nós devemos pagar, mesmo que doa. Por mais terrível que seja, sempre haverá..."
"Não estou no clima para suas frases motivacionais!" Interrompeu Renoir. "Apenas fale o que tem para falar, Alvo. Sem enrolação."
Renoir soou mais duro do que pretendia, mas naquele momento seu humor não estava para lições de vida.
Percebendo a tensão do amigo, Dumbledore suspirou.
"De fato, tenho muitas questões..." Respondeu. "Mas agora, diga-me, meu amigo... Você está bem?"
Ele realmente foi genuíno.
Havia muitas coisas que queria saber. Onde Renoir esteve, como manteve a aparência idêntica de cinquenta anos atrás, mas naquele instante, ele só queria saber se o amigo estava bem.
"Eu deveria estar bem..." Disse Renoir, amargurado. "Vivi minha vida plenamente, achei ter superado minhas obsessões e meus arrependimentos. Pensei ter seguido em frente. Mas, na verdade, apenas enterrei tudo bem fundo, em um lugar longe demais para ver."
No início, Renoir só queria fingir para Dumbledore, temia que o velho percebesse que ele não era o verdadeiro Renoir.
Usou as memórias do antigo para sustentar a conversa, falando das mágoas que o verdadeiro guardou para si mesmo, mas conforme falava, as palavras escaparam de seu controle.
"Guardei tudo. Continuei aceitando a realidade, reprimindo cada arrependimento, cada sonho destruído..."
Após a morte de Aline, Renoir tentou viver como ela sonhou. Pintando, sorrindo, mantendo o mundo que criaram.
Entretanto, ele nunca mais teve coragem de pintar Aline. Tinha medo de não se conter e acabar dando vida a uma versão falsa dela.
Durante os séculos, sempre se perguntava.
"Por quê não?" Pensava. "Ainda seria Aline."
Mas Renoir sabia que mesmo sendo Aline, não seria a sua, seria apenas uma cópia.
E isso o encheu de amargura e frustração.
Por que uma maldita doença a levou?
Por que ela não pôde envelhecer com ele?
Por que nem a magia, nem o Chroma, puderam salvá-la?
Na Tela, Renoir era praticamente um deus onipotente.
Então, por que nem ele conseguiu salvar Aline?
Com as emoções confusas, Renoir acabou contando tudo isso a Dumbledore, que ouviu em silêncio.
E foi justamente por causa desse descuido que Dumbledore abandonou qualquer dúvida que tivesse.
Afinal, ele conhecia Renoir há muito tempo, sabia o quanto ele havia amado Aline. Cada palavra proferida por Renoir carregava uma amargura tão intensa quando a que Dumbledore sentia quando falava de Ariana.
As centenas de anos que o artista passara na Tela deixaram o velho bruxo chocado.
Saber que seu antigo colega agora tinha idade próxima à de Nicolas Flamel foi surpreendente, mas o que mais o impactou foi descobrir que Renoir e Aline criaram um mundo inteiro dentro de uma pintura.