O silêncio que pairava sobre a Arena Myrrin era quase físico. Não era o silêncio da expectativa comum, aquele que antecede um espetáculo. Era denso, pesado — o silêncio que separa os destinados à grandeza daqueles condenados ao esquecimento.
Os telões de cristal flutuantes acenderam com uma luz âmbar suave, banhando os rostos tensos dos candidatos remanescentes.
A voz do sistema ecoou pela arena, firme e imponente:
[PROCESSO DE FILTRAGEM COMPLETO] [TOP 10 DOS CANDIDATOS DA CLASSE E-1 DEFINIDOS] [INÍCIO DAS QUARTAS DE FINAL EM 10 MINUTOS]
Para os 490 candidatos que viram seus nomes desaparecerem das listas, aquele anúncio soava como um sino fúnebre. Mas para os dez que encontraram, foi a primeira vez em que o Império realmente os notava — não como novos prometedores, mas como futuros nomes dignos de memória.
Na área elevada, uma instrutora da Academia desceu as escadas com ciências avançadas. Alta, de armadura prateada que parecia respirar com cada movimento seu, olhos como espelhos d'água profundos e impenetráveis. Duas bandeiras mágicas flutuavam ao seu lado — uma com o brasão imperial dourado, outra com o emblema azul-escuro da Classe E.
Ela parou no centro da arena, sua voz ressoando sem necessidade de amplificação:
"Candidatos classificados da E-1… posicionem-se." Havia uma gravidade em suas palavras que fez todos endireitarem a postura. "Vocês não são mais apenas nomes. São peças do tabuleiro imperial. E apenas um poderá liderar a classe."
Os nomes surgiram a surgir no cristal, gravados em letras de luz dourada:
Bryan Blake – Classe indefinida | Estilo: Assassino / Aura
Laerith d'Envarra – Nobre de Sangue Prateado | Estilo: Espadachim Ilusório
Emeran Reikus – Espadachim Técnico | Estilo: Leitura de Combate Avançada
Kallius Veyren – Sangue Nobre Obscuro | Estilo: Combate com Aura Negra de Impacto
Deyron Orkan – Prole dos Portões do Norte | Estilo: Corpo de Aço e Aura de Ruptura
Halber Lynne – Classe Mista | Estilo: Aura Cortante e Reforço Físico
Kareth d'Varn – Invocador Tático | Estilo: Construtos Defensivos
Aveline Tressir – Maga de Gelo e Contramedidas | Estilo: Controle de Campo
Nirven Hollun – Guerreiro Elemental | Estilo: Condução de Chamas via Lança
Sylas Morn – Espadachim Mágico | Estilo: Correntes de Fogo e Aura Seladora
Bryan permanece nas sombras, encostado em uma das colunas laterais. Seus olhos âmbar observavam os nomes com a frieza de um predador explorando o terreno. Não havia surpresa em seu rosto, apenas uma calma calculista que incomodava os que tentavam lê-lo.
Aqueles que chegaram até aqui têm valor , pensou. Mas todos têm padrões. Todos têm pontos cegos. Todos têm fraquezas expostas quando pressionados.
Dentro dele, algo já trabalhado — uma máquina implacável que disseca cada movimento, cada respiração dos adversários. Para Bryan, cada luta era uma dança mortal, e toda dança tinha um ritmo que podia ser quebrado quando se encontrava o compasso exato.
A instrução de experiência a mão e os chaveamentos surgiram em hologramas etéreos sobre a arena:
Combate 1: Bryan Blake x Sylas Morn
Combate 2: Laerith d'Envarra x Kareth d'Varn
Combate 3: Emeran Reikus x Aveline Tressir
Combate 4: Kallius Veyren x Deyron Orkan
A arena caiu em silêncio novamente. Aquele tipo de silêncio que antecipa tempestades.
Os instrutores aprenderam seus cristais de registro. As luzes flutuantes da cúpula focalizaram o centro do campo encantado, onde os nomes dos primeiros combatentes ardiam em runas:
COMBATE 1 – BRYAN BLAKE vs SYLAS MORN
"Finalmente," disse uma voz vinda da entrada oeste, transmitida de arrogância mal disfarçada.
Sylas tempestade Morn emergiu como contido. Os cabelos escuros com mechas avermelhadas estavam presos por um anel de mana pulsante. Sua armadura leve, ornamentada com atrações carmesins, brilhava sob as luzes da arena. Correntes mágicas cruzavam seus antebraços, cada um deles gravado com runas de fogo ancestral. A lâmina encantada em sua cintura parecia viva — brasas pulsavam sob o metal como veias incandescentes.
Era um espadachim mágico de linhagem pura — não por escolha, mas por nascimento. Filho caçula da Casa Morn, conhecido entre os nobres como "O Berço das Chamas Silentes". Sua confiança o precede, assim como seu temperamento explosivo.
"Então é você…" ele falou, olhos percorrendo Bryan de cima a baixo com desdém calculando. "O miserável com cara de estátua que derrotou nobres como se fossem mendigos. Que se recusa a revelar suas origens. Que esconde sua aura demoníaca como se fosse um truque barato."
Bryan já estava no centro da arena. Imóvel. Silencioso. Seus olhos âmbar observavam Sylas como se estivesse avaliando não um oponente, mas um inseto insignificante sob sua bota.
"Não vai dizer nada?" Sylas riu, um som áspero carregado de falsa confiança. "Típico. A arrogância de quem não tem passado para sustentar."
Ele caminhou em círculos, cada passo amplificando a tensão no ar. O público começou a sussurrar, inclinando-se para frente. As arquibancadas eram completas — alunos, professores, nobres curiosos, todos atraídos pelo evento que definiria a elite da próxima geração.
"Sua farsa acaba agora." Sylas estalou o pescoço, liberando uma leve onda de calor que fez o ar ao redor tremer. "Foi divertido deixar você brincar de assassino misterioso, mas o jogo termina aqui. Eu sou Sylas Morn. E você…"
Ele sacou sua espada em um movimento fluido, a lâmina despertando com um rugido de chamas contidas.
"…você é apenas um acidente a ser corrigido."
Bryan não respondeu. Não mudou de postura. Não foi demonstrada qualquer ocorrência.
A instrução de treinamento de mão. Um raio de luz prateado selou o perímetro da arena.
"Iniciar."
Sylas foi o primeiro a se mover.
Não atacou com a fúria que seu temperamento sugeria — mas com uma frieza técnica impressionante. O chão estalou sob seus pés encantados enquanto avançava com velocidade potencializada por magia. A lâmina flamejante cortou o ar em um arco horizontal perfeito, movendo o pescoço de Bryan.
Bryan desviou por milímetros, movendo apenas o suficiente para evitar o golpe. A espada flamejante passou onde seu pescoço estiver um instante antes, deixando um rastro de calor no ar.
A plateia reagiu com o primeiro suspiro coletivo.
Sylas girou o pulso, canalizando mana para sua arma. Uma explosão controlada de chamas envolveu uma área ao redor de Bryan em um semicírculo ardente.
Bryan saltou, atravessando as chamas com um giro espiral que parecia desafiar a gravidade.
Sylas enviou com desdém. "É só isso?"
A segunda estocada veio diretamente ao coração de Bryan, rápida e precisa.
Bryan bloqueou com a lateral de sua adaga esquerda, o metal negro absorvendo o impacto do fogo sem brilhar. Em um movimento contínuo, ele emendou um contra-ataque com a adaga direita — girando o ombro de Sylas. O nobre retrocedeu com agilidade felina, mas uma linha fina de sangue marcou sua capa cara.
"Tsc." O som escapou entre os dentes cerrados de Sylas.
O duelo se intensificou. Sylas combinava suas estocadas com feitiços de conjuração rápida: golpes horizontais eram seguidos por ondas de calor, estocadas vinham acompanhadas de explosões flamejantes controladas. Ele manipulava o ambiente, o ritmo, alternando velocidade e potência.
Era bom. Muito bom.
Mas Bryan era algo além da compreensão comum.
Ele não lutava como um duelista tradicional. Não floreios, nem movimentos havia ocorridos. Cada ação era econômica, certa, letal. Cada esquiva parecia prever segundos antes do ataque. Cada bloqueio abriu caminho para um corte que vinha de ângulos impossíveis.
Bryan estava lendo Sylas em tempo real. As microexpressões superficiais que antecipavam um golpe. O padrão de respiração que revelou quando uma conjuração estava prestes a ser liberada. O momento exato em que a concentração de mana deixou um flanco desprotegido por milissegundos.
Bryan começou a apertar o cerco.
Sylas foi solicitado a recuar, passo a passo.
A arena estava coberta de fissuras e fragmentos de runas quebradas. As barreiras de contenção tremulavam com a intensidade dos impactos. Os concorrentes nas arquibancadas se levantaram para ver melhor. Os jurados se entreolharam, tomados por uma mistura de espanto e apreensão.
"Maldição…" Sylas murmurou, a respiração irregular, suor escorrendo pela testa. "O que você é?"
Ele ativou sua técnica final.
As correntes em seus braços se soltaram, serpenteando no ar antes de se fundirem com a lâmina de sua espada.
[HABILIDADE ESPECIAL: CORRENTES DO FOGO SELADOR – NÍVEL INTERMEDIÁRIO]
A espada transformou-se em uma extensão viva de sua vontade. Correntes incandescentes serpenteavam pelo campo, tentando enlaçar os tornozelos de Bryan. A calor intensificou-se até que o próprio ar parecia queimado, distorcendo a visão.
Bryan parou.
O campo tremeu sob a pressão das energias liberadas.
"Agora… morra!" Sylas avançou com uma combinação devastadora, concluindo com um corte diagonal descendente que carregava toda sua força e mana equipamentos.
O impacto ricocheteou contra o escudo invisível de Bryan.
Mas ele não recuou. Com um movimento preciso do pulso, Bryan cravou a adaga esquerda no chão. O impulso da conjuração de Sylas foi desviado para o lado, quebrando o padrão de ataque.
Bryan deslizou para fora do alcance das correntes e, com um movimento fluido que os olhos mal conseguiram acompanhar, golpeou diretamente o centro da lâmina de Sylas.
Ela se partiu.
O silêncio que caiu foi absoluto, denso como vidro sobre veludo.
"O quê—?"
Antes que Sylas pudesse terminar, Bryan estava atrás dele.
Um corte preciso, superficial mas perfeito — a lâmina rasgou a armadura encantada como se fosse tecido comum. Sangue escorreu pelo flanco exposto.
Sylas caiu de joelhos, a realidade da derrota completa pesando mais que a dor física.
Bryan cravou a adaga no chão, a milímetros do rosto do adversário. Não preciso tocar nele novamente. Apenas disse, em voz baixa, informações sobre uma frieza absoluta:
"Você fala demais."
Ele se virou e caminhou de volta ao centro da arena, sem olhar para trás nem uma vez.
A instrutora apareceu, erguendo o braço em direção a Bryan:
"Vencedor: Bryan Blake."
As arquibancadas explodiram — não em euforia, mas em choque contido. Era o tipo de fato que nasce quando o impossível acontece diante dos olhos, quando o incompreensível se materializa.
Sylas, ainda de joelhos, mordeu os lábios até sangrar, olhos fixos nas costas de Bryan.
Isso não acaba aqui , jurou em silêncio, veneno destilando em cada pensamento. Vou fazer você pagar por essa humilhação.
Bryan não olhou para trás. Para ele, aquela luta já havia terminado no momento em que começou.
O campo ainda fumegava, fragmentos mágicos das correntes quebradas de Sylas flutuando em uma espiral lenta. A runa da vitória pairava sobre o nome de Bryan, vibrando em tom grave — como se a própria magia da arena fosse perplexa com o ocorrido.
Bryan retornou à sua posição, adagas embainhadas, expressão impassível. Mas ao seu redor, o ambiente era de puro choque contido.
O juiz do centro hesitou antes de confirmar oficialmente o fim do duelo — algo que jamais acontecia. O examinador-mor Franziu o cenho, como se tivesse testemunhado algo que não deveria ter sido revelado tão cedo.
Os demais candidatos reagiam cada um à sua maneira.
Deyron Orkan apertava os punhos, analisando cada detalhe da luta em sua mente metódica.
Laerith d'Envarra mantinha uma postura serena, mas um observador atento notaria a leve tensão em seus ombros — não de medo, mas de reconhecimento instintivo de perigo.
Kallius Veyren sorria levemente, o tipo de sorriso que nasce quando se encontra um desafio verdadeiramente digno.
E Emeran… Emeran apenas respirava fundo, olhos brilhando com entendimento. "Claro," sussurrou, como se confirmasse algo que já suspeitava.
Nas arquibancadas, o burburinho explodiu em várias frentes.
"Ele destruiu a técnica secreta dos Morn como se fosse vidro comum!"
"Viram como ele se moveu? Parecia conhecer cada ataque antes mesmo de Sylas pensar neles."
"A espada dele nem sequer brilhou! Ele venceu sem ativar nenhuma habilidade especial?"
"Quem diabos é esse Bryan Blake?"
E, é claro, houve aqueles que simplesmente silenciaram, porque não havia palavras para o que acabaram de testemunhar.
Na área reservada aos nobres, os olhares eram mais complexos, carregados de cálculos políticos.
"Bryan Blake…" repetiu uma mulher de cabelos dourados e manto esmeralda. "Esse nome não consta em nenhum registro dos clãs de prestígio. Nem dos domínios fluviais, nem das casas montanhesas."
"Dizem que pertence a algum ramo esquecido dos Blake, talvez nobreza rural do sul de Elydor," murmurou um senhor idoso. "Mas não há registros militares, nenhuma participação em campanhas anteriores, sequer um brasão familiar reconhecível."
"Então por que diabos ele luta como um executor imperial treinado por décadas?"
O silêncio respondeu por si só.
Nas arquibancadas inferiores, entre os candidatos já eliminados, os comentários assumiam outro tom.
Algumas jovens que antes mal haviam notado Bryan agora o observavam com interesse renovado.
"Vocês viram como ele se move?" sussurrou uma delas, olhos fixos na silhueta de Bryan. "Aquela postura perfeita, os movimentos precisos… é como uma dança mortal."
"Tem algo nos olhos dele," comentou outra, com um arrepio. "É como se ele não estivesse realmente aqui… como se estivesse vendo além do que mostramos."
"Frio. Belo. E letal."
Elas se calaram por um momento, como se tivessem proferido uma verdade sagrada.
O anúncio seguinte quase se perdeu no tumulto de vozes.
"Intervalo de cinco minutos para restauração do campo mágico. Combate dois em seguida."
Mas os olhares permaneciam em Bryan.
Ele, porém, parecia alheio a tudo isso. De olhos fechados, respirava de maneira ritmada e controlada. Seu corpo já estava completamente recuperado, sem sinal de esforço. Nenhuma vaidade, nenhuma pose, nenhuma celebração.
Se eles soubessem…
…que aquele corpo havia sido moldado não por mestres de espada, mas por tortura sistemática.
…que aquela calma não era disciplina acadêmica, mas contenção de uma alma fragmentada e reconstruída.
…que a identidade "Bryan Blake" era apenas um rótulo colocado por um sistema interdimensional que o disfarçava como nobre de baixa linhagem.
…se eles soubessem que até mesmo esse nome não lhe pertencia de verdade.
Mas eles não sabiam.
E isso bastava por enquanto.
Na área dos juízes, o instrutor de registros cochichava algo no ouvido de um avaliador mais velho. O homem olhou imediatamente para Bryan, depois para os dados flutuantes em seu cristal de anotações.
"Este… nome foi adicionado ao registro oficial apenas doze horas antes do início do exame."
"Tem o selo da Torre Imperial. É legítimo." respondeu o outro. "Mesmo assim, não consigo encontrar nenhum histórico regional de mana que corresponda a esse padrão. Nenhum registro nas academias preparatórias."
"É como se ele tivesse surgido do nada."
"Ou de algum lugar onde não deveríamos estar procurando."
Bryan abriu os olhos. Havia terminado sua contagem cardíaca interna — um ritual pessoal para manter a mente focada no presente. Não olhou ao redor, mas percebia cada olhar em sua direção. Sentia a mudança na atmosfera.
As expressões já não eram de desconfiança superficial. Era algo mais profundo. Uma curiosidade perigosa.
O tipo de curiosidade que, com o tempo, se transformaria em respeito reverente… ou medo instintivo.
Qualquer uma das opções lhe servia.
A arena foi reconstituída pela magia de suporte. O chão pulsava em tons azulados, com runas de reforço reativadas para o próximo confronto.
"Segundo combate das Quartas de Final!" anunciou o juiz principal. "Laerith d'Envarra contra Kareth d'Varn!"
O burburinho retornou com força renovada. Era um duelo ansiosamente esperado — refinamento aristocrático contra poder bruto, dois estilos diametralmente opostos.
Laerith emergiu da lateral como sombra prateada.
Seu cabelo negro-azulado estava preso em uma trança elaborada que revelava a elegância de seu pescoço. Sua armadura, mais semelhante a um vestido de batalha, era de um azul-marinho profundo que parecia absorver luz. Nas mãos, sem espada visível — apenas luvas finíssimas que emanavam uma neblina gélida. Cada passo era silencioso, fluido como água descendo pedra polida. Seus olhos, de um cinza-pálido quase fantasmagórico, não revelavam emoção.
Do lado oposto, Kareth chegou como um terremoto contido.
Com quase dois metros de altura, o herdeiro da Casa d'Varn era um colosso. Seu manto de batalha era feito de pedra viva, que se moldava constantemente ao redor de seu torso como placas de um golem semi-consciente. Braços nus exibiam tatuagens tribais em vermelho-ocre — runas antigas que canalizavam magia terrestre de impacto. Não carregava armas convencionais.
Ele era sua própria arma.
Quando os dois se posicionaram no centro, o contraste era gritante:
Laerith — etérea, imaculada, como o prenúncio de um inverno silencioso. Kareth — imponente, agressivo, como uma montanha prestes a desabar.
"Preparar…" anunciou o juiz.
"Comecem!"
Kareth atacou primeiro, como todos esperavam.
Como um trovão materializado, seu punho revestido por uma luva de rocha mágica desceu com força destruidora. O chão rachou sob o impacto onde Laerith estivera um segundo antes.
Mas ela já não estava ali.
Deslizou para o lado com um giro fluido, quase dançando. Seus pés mal tocavam o solo enquanto se movia. Partículas de gelo começaram a se formar no ar ao seu redor, como poeira de diamantes.
"Fascinante…" murmurou um dos juízes veteranos.
Kareth rugiu, batendo os punhos no chão com força bestial.
Pilares de pedra emergiram do solo em direção a Laerith, tentando encurralá-la contra a barreira da arena.
Laerith simplesmente fechou os olhos.
Um círculo gélido expandiu-se ao seu redor. As colunas começaram a congelar ainda em formação, estalando e se quebrando como galhos ressecados no mais rigoroso inverno.
A nobre estendeu as mãos com elegância refinada.
Duas adagas de gelo puro materializaram-se entre seus dedos delicados, tão transparentes que refletiam luz como cristais perfeitos.
"Você dança com ilusões?" grunhiu Kareth, irritação evidente em sua voz grave. "Então dance COM ISTO!"
Ele saltou no ar, as runas em seus braços brilhando intensamente. Um soco descendente, envolto em aura de pedra flamejante, caiu com fúria titânica.
Laerith ergueu o braço em um gesto delicado.
Um escudo de gelo negro se formou instantaneamente, tão escuro que absorvia luz.
O impacto foi ensurdecedor.
O escudo rachou em todas as direções, fragmentos de gelo negro pulverizando-se no ar. Laerith foi empurrada para trás, deslizando pelo chão como uma pluma arrastada por vendaval.
Mas permaneceu de pé. Sem um arranhão. Sem um tremor em sua postura elegante.
"Ela resistiu ao Golpe do Colosso," murmurou Deyron da arquibancada, olhos estreitos em análise. "Realmente é uma d'Envarra legítima."
Kareth bateu os pés no chão, canalizando mais poder.
O campo inteiro se transformou em um labirinto de estacas de pedra.
Laerith navegou entre elas com precisão sobrenatural, nunca tocando duas vezes o mesmo ponto. Suas adagas giravam em suas mãos como extensões de seus dedos, lançando rajadas cortantes de gelo em forma de meia-lua. Os projéteis acertavam o peito de Kareth e explodiam em fragmentos afiados.
Ele grunhiu, braços cruzados protegendo o rosto.
Mas a cada impacto, sua armadura de pedra ficava mais fina, mais fragmentada.
"Ela está desgastando as defesas dele sistematicamente," observou Emeran. "Como erosão glacial… incansável e inevitável."
Laerith então parou seu balé mortal.
A cinco metros de Kareth, respirou profundamente. Esticou os braços em um gesto elegante.
Uma lâmina longa de gelo negro formou-se diante dela — não mais adagas gêmeas, mas uma espada de cristal puro, ondulando com aura gélida azulada.
"Fria como a Lâmina do Norte," sussurrou um dos juízes mais velhos, com respeito evidente.
Kareth rugiu como besta ferida. Era agora ou nunca.
Seus punhos se envolveram em magma solidificado — uma fusão desesperada entre terra e calor, drenando suas últimas reservas de mana.
Ele saltou, apostando tudo em um único ataque.
Laerith avançou em linha reta perfeita.
O público prendeu a respiração.
A aura de gelo cortou o ar com precisão cirúrgica. Kareth caiu de joelhos. Sua armadura… despedaçada. Suas runas… apagadas.
Sangue escorreu pelo canto de sua boca, mas seu orgulho ainda queimava em seus olhos.
"Você é… maldita…" murmurou, antes de cair de lado, sem forças para continuar.
Laerith permaneceu de pé, impassível. A espada se desfez em partículas que evaporaram no ar como névoa matinal.
Respirou fundo, olhou para os juízes, e apenas assentiu com elegância contida.
As arquibancadas silenciaram novamente, impressionadas com a demonstração de poder refinado. Apenas o som do vento contra as barreiras mágicas preenchia o espaço.
Dois novos nomes surgiram na projeção flutuante:
[EMERAN REIKUS] [AVELINE TRESSIR]
Bryan observava do alto, braços cruzados. Enquanto a maioria dos espectadores não dava tanta importância a esse duelo quanto aos anteriores, ele não perdia um detalhe. Seus olhos estavam fixos em Emeran. O rapaz não era o mais rápido nem o mais forte dos candidatos. Mas era observador.
E isso, Bryan sabia melhor que ninguém, era a verdadeira vantagem no campo de batalha.
Emeran entrou na arena sem afobação. Sua postura não era de alguém que precisava provar algo ao mundo, mas de quem realiza um trabalho metódico. Seu olhar não vagava pela multidão — estava concentrado em sua adversária desde antes de cruzar a linha central.
Aveline já o aguardava. Sua túnica verde-escuro, reforçada com encantamentos defensivos, ondulava suavemente com a energia mágica que controlava. Postura de espadachim mista, combinada com foco em magias de médio alcance. Uma aura azul-clara girava ao redor de sua mão direita como água viva.
Ela sorriu com leve desdém.
"Espero que tenha aprendido algo desde nossa última sessão de treinamento, Emeran," disse, sua voz calma mas cortante como gelo fino. "Porque hoje… não haverá piedade."
Ele respondeu apenas com um aceno seco de cabeça. Nenhuma palavra desperdiçada.
O juiz ergueu a mão. "Preparar."
A tensão condensou-se.
"Comecem!"
Aveline foi a primeira a agir. Com um movimento fluido de dois dedos, formou um selo mágico no ar. Três círculos concêntricos azulados abriram-se sob seus pés — a assinatura de sua magia de controle de campo.
Emeran saltou lateralmente, evitando por centímetros um jato de gelo que cortou o ar como uma lança horizontal.
Ela quer restringir meu campo de movimento logo no início, analisou ele, mente trabalhando em velocidade impressionante.
Desviou de outro ataque lateral e rolou por baixo de um estilete congelado que explodiu contra o chão onde estivera.
Aveline era extraordinariamente ágil, e sua magia, precisa. Não perdia tempo com feitiços elaborados — preferia conjurações compactas de efeito imediato. Extremamente eficientes.
Ela antecipa os ataques com o quadril, Emeran notou. Seu corpo gira meio segundo antes da magia ser liberada.
Emeran deslizou para trás, recuperando fôlego. Empunhava uma espada curta, mais apropriada para contragolpes do que para ataques diretos. Não era arrogante o suficiente para tentar superar uma maga em potência bruta. Ele queria espaço. Informação. Tempo para analisar.
Aveline avançou novamente, dessa vez conjurando simultaneamente dois projéteis gélidos nas laterais e uma explosão frontal. Um ataque em leque, difícil de evitar.
Emeran girou o corpo diagonalmente, escapando por margem mínima. Um dos fragmentos cortou a manga de sua túnica. Sangue escorreu por seu braço.
Ela está fechando meu campo de leitura, pensou. Quer me forçar a entrar na zona de explosão central.
Emeran sorriu. Pequeno. Interno.
Decidiu arriscar um golpe falso.
Avançou repentinamente, a espada girando em arco incompleto — apenas para medir a reação adversária.
Aveline bloqueou com um escudo mágico instantâneo, exatamente como ele esperava.
Reflexo condicionado. Excelente técnica. Mas… previsível.
Recuou novamente.
Aveline sorriu com confiança crescente.
"Vai ficar apenas me testando até se cansar?"
"Sim," respondeu ele com calma desconcertante. "Foi exatamente assim que você perdeu em nossa última prática."
Os olhos dela se estreitaram perigosamente.
Ela avançou com nova determinação.
Três feitiços em rápida sequência. Um direcionado ao chão — armadilha de gelo explosivo. Outro no ar — espinhos congelados em dispersão. E o terceiro, um lançamento giratório que se dividia em múltiplos projéteis.
Emeran saltou.
Foi atingido parcialmente. Uma lança de gelo rasgou seu ombro, abrindo um corte profundo.
Mas não recuou. Não havia sinal de dor em seu rosto. Apenas concentração absoluta.
"Agora," murmurou.
Usou a perna para deslizar por baixo da armadilha, a espada vindo de baixo para cima em diagonal precisa.
Aveline conjurou uma parede de gelo reflexivo para bloquear.
Emeran já esperava por isso. A lâmina bateu e ricocheteou, mas era apenas uma distração.
Com a outra mão, lançou um punhal secundário — embebido em aura ruptura — direto no flanco desprotegido dela.
Aveline tentou erguer seu escudo mágico. Tarde demais.
O punhal raspou sua cintura e explodiu em energia crua. Ela caiu de lado, rolando para evitar o golpe final. Emeran a perseguiu com passos curtos e calculados. A cada movimento, ele encurtava o tempo de reação dela.
A plateia observava em silêncio.
O combate era técnico demais para os espectadores comuns apreciarem. Mas para os olhos treinados, era uma aula sobre leitura de oponente e adaptação estratégica.
Aveline se ergueu, ofegante. Sangue escorria do ferimento em seu flanco. Ela flexionou a mão, preparando outro selo defensivo.
Mas parou abruptamente.
A ponta da espada de Emeran estava a dois centímetros de sua garganta.
O juiz congelou o tempo com um gesto.
"Vitória: Emeran Reikus."
A arena expirou coletivamente.
Emeran recuou, guardando a espada com um movimento fluido. O ferimento em seu ombro sangrava livremente, mas ele parecia alheio à dor.
Aveline manteve a cabeça erguida. Frustração evidente em seus olhos, mas também um respeito recém-formado.
Emeran se aproximou e disse, num tom apenas audível para ela:
"Você luta excepcionalmente bem. Mas você lê apenas com os olhos. Eu leio com o corpo inteiro."
Ela não respondeu verbalmente.
Mas assentiu com respeito genuíno.
Emeran virou-se e deixou a arena com passos firmes. A multidão murmurava, impressionada. O candidato que muitos consideravam apenas mediano acabara de demonstrar um dom raro — não de poder bruto, mas de compreensão profunda do combate.
Bryan, do alto de seu posto de observação, reconheceu com um leve aceno. O garoto estava evoluindo rapidamente.
E isso poderia se tornar tanto um trunfo quanto um incômodo, dependendo de como as peças se movessem no tabuleiro.
O último combate das quartas-de-final estava prestes a começar.
A tensão que pairava sobre a arena era quase palpável. Não havia magia no ar, nenhuma torcida ruidosa. Apenas expectativa concentrada. O duelo entre Kallius e Deyron não era apenas um confronto entre dois prodígios — era um choque entre filosofias de combate diametralmente opostas.
De um lado, Kallius Veyren.
Concentração absoluta emanava dele como uma aura física. Seus passos eram silenciosos, a respiração controlada em ciclos perfeitos. Ele personificava o conceito de controle absoluto. Cabelo negro preso em rabo-de-cavalo preciso, túnica de combate ajustada para maximizar mobilidade e minimizar ruído. Um espadachim arcano com olhos cinza-escuros que lembravam brasas adormecidas — frios, mas internamente incandescentes.
Do outro lado, Deyron Orkan.
Postura irredutível, expressão esculpida em pedra, corpo como fortaleza viva. Músculos definidos se moviam com precisão mecânica sob a armadura leve de batalha. Empunhava uma espada larga com uma única mão como se fosse um mero graveto, enquanto seus olhos analisavam o oponente com frieza matemática. Cada movimento seu era calculado até o último grau.
Os dois se encararam por longos segundos. Sem provocações. Sem intimidações teatrais. Apenas respeito mútuo e uma prontidão absoluta para dominar o oponente.
O juiz sinalizou o início. O chão tremeu com a energia liberada.
Kallius atacou primeiro, movendo-se com velocidade impressionante. Sua lâmina curva brilhou com encantamento de impacto, e seu corpo pareceu desaparecer por um instante — reaparecendo à esquerda de Deyron. Um golpe lateral preciso visava o ponto vulnerável abaixo das costelas, onde a proteção era mínima.
Deyron bloqueou sem sequer olhar para o lado.
A espada larga prorrogação-se como um muro intransponível. Metal rangeu contra metal. Faíscas voaram. Um giro rápido de pulso. Kallius recuou imediatamente, deslizando pelo chão como névoa viva.
"Impressionante", comentou Deyron, sem emoção aparente.
Ele avançou.
A arena inteira pareceu sentir o peso de sua presença.
Cada passo de Deyron era como o anúncio de algo revelado. Não era particularmente rápido, nem preciso ser. Seu estilo consistia em construir pressão sistemática, uma parede que se fechava gradualmente até não restabelecer espaço para manobra. A espada larga cortava ou era com força brutal, mas controlada com precisão científica.
Kallius girava ao seu redor como sombra inquieta, atacando com estocadas rápidas, buscando qualquer abertura.
Mas não havia falhas aparentes. Deyron era uma fortaleza ambulante.
Kallius percebe que você precisa mudar de estratégia.
"Técnica básica não será suficiente", murmurou para si mesmo.
Ativou a runa gravada na parte interna de seu pulso. O ar ao redor dele se adensou visivelmente. Um encantamento de múltiplas imagens foi liberado — ilusões tão perfeitas que cada uma projetava sombra própria e produzia sons sutilmente diferentes ao se mover.
Era sua técnica especial. O Espelho de Cinzas.
Deyron parou, olhos percorrendo as quatro imagens idênticas de Kallius que agora o cercavam. Todos os reais e falsos simultaneamente. Ele estreitou os olhos, erguendo a espada em posição defensiva.
"Confundir a visão… então terei que sentir," sua voz soou grave, metálica.
Kallius aproveitou o momento de hesitação. Todas as denúncias atacaram simultaneamente. Três eram ilusões perfeitas. A verdadeira veio por baixo, mirando o tendão de Aquiles de Deyron — um corte rápido e letal que terminaria o combate instantâneo.
Foi quando o chão sob Kallius explodiu.
Deyron havia ativado uma pista de impacto previamente posicionada. A onda de choque dispersou as ilusões e forçou o verdadeiro Kallius a saltar para trás, interrompendo seu ataque decisivo.
A plateia conteve o fôlego coletivamente. Era o tipo de combate que exigia silêncio e olhos atentos. Estratégia contra estratégia, mente contra mente.
Deyron não avançou. Simplesmente esperou, avaliando.
"Você já entendeu que não sou um alvo convencional."
Kallius limpou uma linha de sangue do canto da boca.
"E você ainda não compreendeu… que estou apenas testando os limites da sua defesa."
Então chegou o momento decisivo.
Kallius atacou frontalmente, em linha reta perfeita. Um movimento óbvio demais. Deyron preparou a defesa, mas algo no último segundo o alertou — o giro do quadrilátero de Kallius estava diminuindo fora de alinhamento.
Uma finta. Uma armadilha.
O verdadeiro ataque veio com uma adaga auxiliar oculta no antebraço. Uma estocada curta, rápida, dirigida precisamente ao flanco esquerdo desprotegido.
Deyron moveu-se. Mais rápido para que sua estrutura corporal seja possível.
Bloqueou o golpe com a lateral da lâmina, um movimento extremamente difícil de executar com uma espada de tal peso.
Mas naquele instante… surgiu uma falha.
A perna de apoio de Deyron cedeu minimamente. Um desequilíbrio quase imperceptível.
Kallius não percebeu. Mas Deyron sim. E reagiu antes que pudesse ser explorado.
Com uma explosão repentina de aura, avançou. Dois golpes em rápida sucessão.
Um corte diagonal atravessou o peito de Kallius, rasgando sua túnica e expondo uma linha fina de sangue. O segundo, um impacto com o pomo da espada no plexo solar, derrubou o espadachim de joelhos.
"Droga," Kallius cuspiu sangue, regularizando a derrota.
"Você é mais veloz e técnico superior", admitiu Deyron, erguendo a lâmina em saudação respeitosa. "Mas identifiquei seu padrão de movimento. Você usou os mesmos cinco pontos de apoio em sequências repetidas."
Um silêncio reverente caiu sobre uma arena.
O juiz principal anunciou: "Vitória: Deyron Orkan."
A plateia irrompeu em discussões admiradas. Não houve um triunfo espetacular ou brutal. Havia sido metódico. Preciso. Calculado.
Kallius é atraente com dificuldade visível. Estendeu a mão para Deyron.
"Mereceu cada centímetro dessa vitória."
"Espero enfrentá-lo novamente quando estiver mais forte", respondeu Deyron, com um raro vislumbre de emoção.
Ambos deixaram uma arena sob olhares respeitosos.
E do ponto de observação privilegiado, Bryan continuou analisando silenciosamente. Memorizando padrões. Identificando fraquezas. Planejando.
As semifinais seriam decididas em breve. E com cada luta, o verdadeiro jogo apenas começava a se revelar.